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BOMBA DA SEMANA: Número real de casos de covid-19 no Brasil chega a 8 milhões, diz estudo



País tem 1 milhão de casos e 48 mil mortes pelo novo coronavírus, mas testa pouco e vê explodir número de óbitos por "doença respiratória não conhecida"



O Brasil foi o segundo país do mundo a ultrapassar a marca de 1 milhão de casos confirmados do novo coronavírus, ficando atrás apenas dos Estados Unidos, que já superaram os 2 milhões de contaminados.


Em 26 de fevereiro, quando o primeiro caso foi confirmado por aqui, havia duas orientações centrais da Organização Mundial da Saúde para enfrentar o avanço do vírus: ampliar a capacidade de testagem da população, aliada a uma política contundente de isolamento social.


Ao longo dos meses, nenhuma das duas estratégias foi implementada com sucesso em todo o país, e o aguardado pico da pandemia, hoje esperado para o fim de julho, é adiado a cada mês pelas autoridades de saúde. Foram três meses para o país chegar a 500 mil casos, no dia 31 de maio. Menos de um mês depois, este número dobrou.


Desde o início deste mês, o país vem registrando uma média diária de 25 mil novos casos da doença. Por si só, os números já são preocupantes, mas as pesquisas científicas que têm sido feitas apontam para uma realidade ainda mais dura – tanto em casos quanto em mortes.


Casos

De acordo com um modelo matemático desenvolvido na Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), em Minas Gerais, rodado na semana passada, quando o acumulado estava em torno de 900 mil, os números da pandemia são em média nove vezes o notificado e já chegam a 8 milhões de casos confirmados da covid-19, contando os assintomáticos, o que representa 4% da população do país.


“A primeira vez que rodamos a equação, em março, a subnotificação estava em 12 vezes. Até o início de junho, houve uma pequena ampliação na testagem, o que reduziu essa diferença para uma média de nove vezes”, diz Rodrigo Weber, pesquisador do Departamento de Ciência da Computação da UFJF.


Para chegar ao número aproximado de doentes, os pesquisadores usaram um modelo computacional que comparou os números de infectados e mortos do Brasil com Coreia do Sul e Itália, escolhidos por terem uma política de testagem consolidada.


Dados recentes do Ministério da Saúde, de 4 de junho, apontam para a realização de 1,08 milhão de testes desde o início da pandemia, uma média de 8,7 mil exames por milhão de habitante. Na Coreia do Sul esse índice é de 22 mil (mais que o dobro) e na Itália, 80 mil (quase 10 vezes).


A pesquisa da UFJF foi publicada na revista cientifica “Chaos, Solitons & Fractals” e chegou até a Agência Brasileira de Investigação, a Abin, que tem utilizado as projeções do estudo em um grupo de trabalho interdisciplinar que avalia o avanço da covid-19 no Brasil.


A ausência de uma política de testagem em massa significa que o país segue navegando às cegas em meio à maior pandemia deste século, que já vitimou quase meio milhão de pessoas no mundo. Apesar da doença seguir avançando, os estados também estão em processo de flexibilização das medidas de isolamento social, o que eleva o risco de novos surtos de infecção.


“Para fazer uma testagem mais ampla, é preciso envolver a atenção básica, as Unidades Básicas de Saúde, que existem em diversos bairros do Brasil. Os agentes de saúde também poderiam fazer visitas nas casas para orientar os moradores, mas não há previsão de nada disso”, diz Ana Freitas, médica sanitarista do Instituto de Infectologia Emílio Ribas.


Mortes incógnitas

Os dados disponíveis também indicam que o número de mortes pela covid-19 no país, que atualmente se aproximam de 50 mil, são provavelmente muito superiores.


Quando um brasileiro internado morre no hospital, o médico responsável é obrigado a sinalizar a causa da morte no atestado de óbito — sem esse documento, não há liberação para o enterro. No país, a classificação para vítimas de doenças respiratórias é denominada de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG), o que inclui as categorias de vírus gripais, como influenza A e B, e agora conta também com o Sars-CoV-2, o causador da covid-19.


A diretriz nacional atualmente em vigor só autoriza especificar o vírus causador se houver confirmação de exame laboratorial, limitando a possibilidade de o médico estabelecer a causa apenas pelo conjunto de sintomas.


O atraso e limitação da realização de testes para o novo coronavírus no país também significa, portanto, um atraso e limitação na identificação de vítimas da doença. Sem a possibilidade de confirmar o vírus, a vítima entra na estatística da SRAG por causa indeterminada.


De acordo com a plataforma InfoGripe, que é gerenciada pela Fiocruz, desde a semana oito deste ano, quando os primeiros casos da covid-19 foram registrados, houve uma explosão de óbitos classificados como SRAG por causa indeterminada.


Segundo análise feita pela EXAME, nessas 16 semanas, encerradas em 12 de junho, o país soma 34 mil mortes por doenças respiratórias não conhecidas, uma média de 2 mil vítimas por semana.


Para infectologistas ouvidos pela reportagem, o aumento dos registros está diretamente ligado ao avanço da pandemia, já que no mesmo período do ano passado, a média de mortes não chega a 300 por semana.


“Existe uma série de justificativas quando uma pessoa vai à óbito por razões respiratórias e não há classificação específica da causa da morte, como uma coleta inadequada do material, um teste inconclusivo em que não há mais amostras, ou até mesmo uma morte inesperada em que não houve coleta”, diz o médico Antonio Carlos, da Sociedade Brasileira de Infectologia.


Projeção para o futuro

Além da falta de testes, e de estarmos há mais de um mês com um ministro “interino” da Saúde, há outro agravante para prever quando a curva de casos e mortes diárias entrará em queda: o fato de o Brasil ser um país continental.


De acordo com dados do Ministério da Saúde, da semana encerrada em 5 de junho para a semana encerrada em 12 junho, houve um aumento de apenas 2% nos registros de novos casos, 177.668 contra 174.406, respectivamente. No entanto, a própria pasta evita falar em uma tendência de estabilização, porque há regiões do país que ainda estão com números em ascensão.


É o caso de Minas Gerais, por exemplo, que tentou colocar em prática um plano de reabertura da economia, mas precisou voltar atrás e agora avalia decretar lockdown, segundo informou nesta sexta-feira, 19, o secretário de Saúde, Carlos Eduardo Amaral, em entrevista ao Estado de Minas. Em um mês, Belo Horizonte, a capital mineira, saltou de 40% de ocupação de leitos de UTI para 80%.


Outra preocupação de autoridades mineiras é o avanço da covid-19 para o interior. Segundo um levantamento do projeto Coronavírus-MG, em menos de um mês o número de mortes provocadas pela pandemia quase triplicou fora da região metropolitana, saltando de 121 óbitos em 19 de maio para 336, no último dia 16.


Na última quarta-feira, 17, o diretor executivo da Organização Mundial de Saúde (OMS), Michael Ryan, disse que há sinais de contenção da pandemia por aqui, mas recomenda cautela. “Já vimos isso acontecer antes. Pode haver sinais de estabilização por uns dias e a doença voltar a decolar”.


Em comparação com outros países, a situação brasileira é dramática. A Europa que registrou casos cerca de três semanas antes do Brasil, já está em processo amplo de reabertura, com expectativa de liberação das fronteiras internas do bloco europeu já em 1º de julho. Em meados de maio, Itália e Espanha, os dois países mais afetados, já registravam queda nos casos diários da covid-19.


Nos EUA, onde a pandemia também dura mais tempo do que em outros lugares, a tendência de diminuição no número de casos tem sido observada na última semana, ainda que haja preocupação com novos focos e mudança no perfil de regiões mais afetadas.


Já países como Índia e México observam os índices crescerem a cada dia, com a reabertura gradual da economia. Tal qual no Brasil, em ambos os países estima-se que o número de contágio seja bem maior que o registrado, dado o baixo número de exames realizados.


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