Consumidora ficou três dias sem energia elétrica, mesmo não sendo notificada da inadimplência e pagando a fatura
A Energisa se utiliza do lado conveniente da legislação para se beneficiar, mas não cumpre o lado que facilita a vida do consumidor. Em mais um recente julgado do 2º Juízo Especial Cível, a concessionária foi condenada ao pagamento de indenização por dano moral no valor de R$ 8 mil a um consumidor residente no bairro São João Bosco, zona Norte de Porto Velho por suspensão do fornecimento de energia elétrica, sem notificação prévia. O motivo da suspensão do fornecimento foi o atraso no pagamento da fatura referente ao mês de julho/2019 no valor de R$ 665,43. A consumidora apresentou o comprovante de pagamento após a suspensão em 11 de setembro de 2019. A Energisa alega ter notificado a autora quando à inadimplência em setembro de 2019, mas na realidade, a fatura do mês de setembro consta a notificação de inadimplência do mês de agosto e não do mês de julho. O 2º Juizado Especial Cível disse na sentença que a interrupção ocorreu de forma ilegítima, pois não houve notificação prévia do corte de fornecimento de energia elétrica realizado dia 10 de setembro de 2019. O resultado desse ato ilegal foi o que gerou o dever da Energisa em indenizar a cliente: a consumidora ficou três dias sem energia até ter seu fornecimento restabelecido pela concessionária, mesmo pagando a fatura no dia seguinte ao corte e não ter sido notificada. Sobre a questão, o Juízo discorreu sobre a Resolução 414/2010 da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) – que Estabelece as Condições Gerais de Fornecimento de Energia Elétrica, dentre eles, os direitos e deveres do consumidor de energia elétrica, em seu artigo 173. Esse dispositivo prevê a notificação da concessionária ao consumidor inadimplente com antecedência de 3 dias antes do corte de fornecimento de energia. O Juízo também lembrou o artigo 176 da mesma Resolução que impõe às concessionárias o dever de restabelecer o fornecimento de energia elétrica em até 24 horas (para unidades consumidoras da área urbana), ou 48 horas (para unidades da zona rural). “Infere-se que a ré agiu indevidamente ao suspender o fornecimento de energia sem notificação específica. Frisa-se que, nesses casos, o dano moral deflui da essencialidade do serviço, que deve ser prestado de forma contínua e eficiente. Portanto, não se pode cogitar a hipótese de mero dissabor, pois a privação de uso do serviço essencial por dias e a ausência de comunicação prévia, certamente causam dano moral” – consta da sentença. Confira a sentença: PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RONDÔNIA Tribunal de Justiça de Rondônia Porto Velho - 2º Juizado Especial Cível Avenida Pinheiro Machado, nº 777, Bairro Olaria, CEP 76801- 235, Porto Velho, - de 685 a 1147 - lado ímpar 7040442- 33.2019.8.22.0001 - Procedimento do Juizado Especial Cível REQUERENTE: CHEILA EDJANE DE ANDRADE RAPOSO, RUA HUMBERTO CORREIA 1335, - ATÉ 1383/1384 SÃO JOÃO BOSCO - 76803-690 - PORTO VELHO – RONDÔNIA ADVOGADO DO REQUERENTE: VIVALDO GARCIA JUNIOR OAB nº RO4342 REQUERIDO: CENTRAIS ELETRICAS DE RONDONIA S/A - CERON, AVENIDA DOS IMIGRANTES 4137, - DE 3601 A 4635 - LADO ÍMPAR INDUSTRIAL - 76821-063 - PORTO VELHO - RONDÔNIA ADVOGADO DO REQUERIDO: ENERGISA RONDÔNIA, ROCHILMER MELLO DA ROCHA FILHO OAB nº RO635, DIEGO DE PAIVA VASCONCELOS OAB nº RO2013, MARCIO MELO NOGUEIRA OAB nº RO2827 SENTENÇA Vistos etc. Relatório dispensado na forma do artigo 38 da Lei 9.099/95. A autora ajuizou a presente ação visando, em sede de tutela de urgência, o imediato restabelecimento do fornecimento de energia elétrica, e, no MÉRITO, a condenação da ré ao pagamento de indenização no valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) a título de indenização por danos morais em razão do corte no fornecimento de energia elétrica realizado no dia 10/09/2019, sem prévia notificação. Foi deferido o pedido de tutela de urgência (ID 30838994). Em contrapartida, a ré alegou que o motivo da suspensão do fornecimento foi o atraso no pagamento da fatura referente ao mês de julho/2019 no valor de R$ 665,43 (seiscentos e sessenta e cinco reais e trinta e quatro centavos), sendo que a autora apresentou o comprovante de pagamento somente após a suspensão, ou seja, em 11/09/2019. Salientou que realizou uma notificação quanto a inadimplência na fatura do mês de setembro/2019. Analisando detidamente o caso concreto verifica-se que o procedimento de interrupção de energia elétrica do imóvel da autora ocorreu de forma ilegítima, pois, diferente do alegado na contestação, na fatura do mês de setembro/2019 apresentada no corpo da contestação consta a notificação quanto a inadimplência da fatura do mês de agosto/2019 no valor de R$ 1.486,52 (um mil quatrocentos e oitenta e seis reais e cinquenta e dois centavos), portanto, de fato, a consumidora não foi previamente notificada do corte no fornecimento de energia elétrica realizado no dia 10/09/2019. A Resolução Normativa n.º 414/ANEEL, apresenta em seu artigo 173 o seguinte enunciado: “Art. 173. Para a notificação de suspensão do fornecimento à unidade consumidora, prevista na seção III deste Capítulo, a distribuidora deve observar as seguintes condições: I – a notificação seja escrita, específica e com entrega comprovada ou, alternativamente, impressa em destaque na fatura, com antecedência mínima de: a) 3 (três) dias, por razões de ordem técnica ou de segurança; ou; b) 15 (quinze) dias, nos casos de inadimplemento”. (destaquei) Infere-se que a ré agiu indevidamente ao suspender o fornecimento de energia sem notificação específica. Frisa-se que, nesses casos, o dano moral deflui da essencialidade do serviço, que deve ser prestado de forma contínua e eficiente. Portanto, não se pode cogitar a hipótese de mero dissabor, pois a privação de uso do serviço essencial por dias e a ausência de comunicação prévia, certamente causam dano moral. No tocante ao restabelecimento de energia, estabelece o artigo 176 da Resolução 414/00 da ANEEL que: “Art. 176. A distribuidora deve restabelecer o fornecimento nos seguintes prazos, contados ininterruptamente: I - 24 (vinte e quatro) horas, para religação normal de unidade consumidora localizada em área urbana; II - 48 (quarenta e oito) horas, para religação normal de unidade consumidora localizada em área rural; Frente a isto, cabia a ré proceder a religação no prazo supracitado, como determina a resolução da ANEEL acima transcrita, tal, porém, não ocorreu, posto que a autora alega que após a quitação da dívida, a ré não promoveu a religação. Restou incontroverso que a autora apresentou o comprovante de pagamento da fatura em aberto em 11/09/2019 e a ré promoveu a religação somente após a citação (14/09/2019), sendo que tinha o prazo de 24 (vinte e quatro) horas para atender a solicitação da consumidora. Assim, de rigor o reconhecimento da responsabilidade da ré pela falha na prestação dos serviços, já que manteve a suspensão do serviço mesmo após o pagamento do valor em aberto. A ré não atendeu ao quanto disposto no artigo 176 da Resolução 414/00 da ANEEL. Dessa forma, reconheço o dano moral decorrente da ausência de notificação da suspensão do fornecimento à unidade consumidora da autora e da demora da concessionária em adotar as medidas cabíveis para normalizar o fornecimento de energia elétrica. No caso concreto, a consumidora pagou o débito em aberto e teve de amargar dias de espera, somente findos por força de ordem judicial. Uma vez cessado o motivo da suspensão, a concessionária deve restabelecer o serviço no prazo de 24 horas após a solicitação da consumidora ou a partir da baixa do débito. O fornecimento de energia elétrica é serviço essencial à vida moderna, pode-se presumir os transtornos causados a consumidora pela negativa deliberada de cumprimento de normativo da ANEEL, deixando de notificar a consumidora da suspensão de fornecimento de energia elétrica em sua residência/unidade consumidora e demorando a religação do fornecimento de energia por prazo superior ao estabelecido na norma administrativa. Não bastasse isso, o descaso na solução do problema constitui afronta ao direito do consumidor e causa frustração e um sentimento de falta de consideração, com a ausência de providência no sentido de dar solução ao problema apresentado, situação que excede a normalidade, como no caso presente, em que extrapolou o mero aborrecimento ou simples transtorno. É evidente que a autora sofreu indevido constrangimento pela ausência de notificação da suspensão do fornecimento de energia elétrica e pela excessiva demora da ré em regularizar o fornecimento de energia, suportando danos de natureza moral, representados pelo sensível desconforto a que ficou submetido no período em que a energia elétrica injustamente deixou de lhe ser fornecida. A ré, por ter praticado conduta ilegal, causou danos morais a autora, que tem direito à indenização, nos termos do art. 927 do Código Civil, do artigo 14 da Lei nº 8.078/90 e art. 5º, inciso V, da Constituição Federal. Evidenciada a ilicitude do ato praticado pela parte ré, que descumpriu o prazo estipulado pela ANEEL para religação de energia da unidade consumidora da autora, causando-lhe lesão à honra e reputação, caracterizado está o dano moral puro, exsurgindo, daí, o dever de indenizar. Presente o dano moral, resta apenas fixar o valor da indenização, que é a tarefa mais árdua em se tratando de indenização por dano moral, uma vez que a um só tempo lidamos com duas grandezas absolutamente distintas, uma imaterial (a dor sofrida) e outra material (o dinheiro). Compatibilizar o abalo com um valor monetário que, de alguma forma, represente não um pagamento, mas sim um lenitivo, é muito difícil. A fixação do dano moral, segundo a doutrina e jurisprudência dominantes, deve, entre outras circunstâncias, se ater às consequências do fato, servir como desestímulo para a prática de novas condutas lesivas, observando-se sempre a capacidade financeira do obrigado a indenizar, de forma que o quantum não implique em enriquecimento indevido do ofendido. Referido valor passa, invariavelmente, pelo arbítrio do juiz. Neste feito, temos como litigantes de um lado uma consumidora e de outro uma grande concessionária de serviços públicos. Em que pese o ato ilícito praticado, não se pode deixar de registrar o fato da autora ter pago em atraso a fatura de julho/2019, sendo este o fato gerador do evento danoso, o que não exime a ré de sua responsabilidade. Ora, não pode a autora ficar inadimplente e esperar que o fornecimento do serviço continue sem interrupção. Inegável, pois, que a autora contribuiu para a interrupção do serviço. Com base nestes parâmetros, reputo como suficiente para alcançar os objetivos já delineados que a indenização seja arbitrada em R$ 8.000,00 (oito mil reais), quantia que entendo justa e razoável para suprir os fatos danosos analisados a presente demanda. Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE EM PARTE O PEDIDO INICIAL e, com fundamento no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, dou por extinto o feito, com resolução de MÉRITO, para o fim de condenar a ré a pagar para a autora, a título de indenização por danos morais, o valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais), atualizado monetariamente e acrescido de juros legais a partir da publicação desta DECISÃO. Confirmo a DECISÃO de tutela de urgência concedida. Sem custas e sem honorários nesta instância, haja vista tratar-se de DECISÃO proferida em primeiro grau de jurisdição, no âmbito dos Juizados Especiais, na forma dos artigos 54 e 55 da Lei 9.099/95. Nos moldes do artigo 52, incisos III e IV, da Lei 9.099/95, a devedora fica ciente de pagar, independente de nova intimação, após o trânsito em julgado, o valor da condenação, no prazo de 15 (quinze) dias, sob pena de multa de 10% (dez por cento). O valor da condenação obrigatoriamente deverá ser depositado junto a CAIXA ECONÔMICA FEDERAL (Provimento 001/2008 PR TJ/RO), com a devida e tempestiva comprovação no processo, sob pena de ser considerando inexistente o pagamento realizado através de outra instituição bancária, nos termos do artigo 4º do Provimento Conjunto n.º 006/2015-PR-CG, incidindo a pena prevista no artigo 523, §1º, do CPC, além de juros e correção monetária previstas em Lei. Havendo pagamento espontâneo, desde já defiro a expedição do respectivo alvará, para levantamento. Decorrido o prazo para pagamento espontâneo, não havendo manifestação da autora, arquive-se. Intimem-se. Serve a presente SENTENÇA como intimação no DJE/carta/ MANDADO. ADVERTÊNCIAS: 1) OS PRAZOS PROCESSUAIS NESTE JUIZADO ESPECIAL, INCLUSIVE NA EXECUÇÃO, CONTAMSE DO DIA SEGUINTE À INTIMAÇÃO, SALVO CONTAGEM A PARTIR DE INTIMAÇÃO PELO DIÁRIO DA JUSTIÇA, QUE OBEDECE REGRA PRÓPRIA. 2) AS PARTES DEVERÃO COMUNICAR EVENTUAIS ALTERAÇÕES DOS RESPECTIVOS ENDEREÇOS, SOB PENA DE SE CONSIDERAR COMO VÁLIDA E EFICAZ A/O CARTA/MANDADO DE INTIMAÇÃO CUMPRIDO(A) NO ENDEREÇO CONSTANTE DOS AUTOS (ART. 19, § 2º, LF 9.099/95).