Propostas sobre o tema dispararam na nova Legislatura, com 119 textos em nove meses, e preveem, por exemplo, tornozeleira para agressor
Os deputados federais que assumiram uma vaga na Câmara neste ano passaram a dar uma atenção extra ao tema violência contra a mulher. O número de proposições apresentadas até setembro chegou a 119, mais de quatro vezes superior às 23 apresentadas no período semelhante em 2015, no início da legislatura anterior.
Os dados aparecem no site da Câmara na busca por projetos que relacionem as palavras “violência” e “mulher”. A grande maioria diz respeito a projetos de lei que tentam ampliar ou endurecer a Lei Maria da Penha, de 2006.
Entre as novas iniciativas está o projeto aprovado nesta semana que facilita o divórcio de vítimas de violência doméstica. O texto vai à sanção do presidente Jair Bolsonaro, que neste ano também já validou lei que permite a delegados e policiais emitirem medidas protetivas de urgência para vítimas de violência doméstica. Outra regra sancionada foi a obrigação de agressores de mulheres ressarcirem o SUS pelo custo do atendimento às vítimas.
Os projetos de lei em tramitação propõem a criação de regras das mais variadas. Uma delas, do deputado Hugo Leal (PSD-RJ), pede que os agressores sejam obrigados a usar tornozeleira eletrônica. Outro, da deputada Mariana Carvalho (PSDB-RO), pede fiança de até 200 salários mínimos.
Para Gabriela Mansur, promotora da Justiça e especialista em direito das mulheres, o aumento de proposições reflete o esforço para o aumento da presença das mulheres nos cargos políticos, com regras como a que determinou a destinação de pelo menos 30% do fundo eleitoral para candidaturas femininas. Nas eleições de 2018, o número de deputadas subiu de 10% para 15%.
“Quando as mulheres levantam suas bandeiras e participam de forma mais ativa da política, sendo eleitas ou não, as bandeiras se tornam mais visíveis, e outras pessoas escutam e passam a discutir o tema”, afirma.
Segundo Mansur, o aumento de projetos é também um reflexo do aumento da violência contra a mulher. O número de feminicídios cresceu 4% em 2018, na contramão dos homicídios, que caíram, segundo levantamento do Fórum Brasileiro de Segurança Pública feito com base em dados de boletins de ocorrência.
“Há uma cobrança da sociedade para toda forma de prevenção. Houve uma necessidade para o que poder Legislativo se movimentasse mais rapidamente para atender essa demanda”, diz.
Movimento feminista
Segundo a deputada Sâmia Bomfim (PSOL-SP), que tem como uma de suas bandeiras a luta feminista, o debate sobre a violência aumentou porque o movimento feminista cresceu e chamou a atenção para o tema, o que obriga a sociedade a discutir e os políticos a formulares políticas públicas. “É um problema grave tendo em vista que o Brasil é o quinto país que mais mata mulheres no mundo pelo fato de elas serem mulheres”, diz.
Sâmia assina dois projetos ligados ao tema. Um deles prevê a obrigatoriedade de afixar em locais públicos a placa da Central de Atendimento à Mulher, pelo telefone 180, e a criação da Campanha Nacional Maria da Penha nas Escolas.
Para a deputada, o fato de ser um tema forte e uma questão consensual acaba fazendo mais parlamentares abraçarem a bandeira mesmo sem ter contato próximo com as entidades de mulheres e especialistas no tema. O que, segundo ela, faz que haja projetos de qualidade contestável entre outros que precisam ser celebrados.
A parlamentar defende que o avanço no combate à violência contra a mulher passa por uma mudança de cultura. “A Lei Maria da Penha é ótima, é uma das melhores do mundo e precisa ser cumprida, mas nunca teve prioridade orçamentária e nunca foi de fato implementada no nosso país. O problema tem que ser tratado na raiz, na criação de uma cultura não machista e de capacidade de acolhimento das mulheres vítimas de violência”, afirma.
Veja alguns dos projetos:
- Prevê como medida protetiva de urgência o uso de tornozeleira eletrônica pelo agresso e determina que a utilização dos equipamentos de monitoramento eletrônico seja custeada pelos condenados.
- Obriga a criação das "Patrulhas Maria da Penha" nos municípios com mais de 100 mil habitantes.
- Possibilita ao juiz submeter o agressor à monitoração eletrônica a fim de dar maior efetividade ao cumprimento de medidas protetivas de urgência nos casos de prática de violência doméstica e familiar contra a mulher.
- Dispõe sobre a obrigatoriedade de empresas fabricantes de aparelhos celulares introduzirem aplicativo permanente nos aparelhos celulares que saem de fábrica e nos antigos para acionar a polícia em caso de violência contra a mulher.
- Estabelece o uso de monitoramento eletrônico como meio de fiscalizar o cumprimento das medidas protetivas, bem como para disponibilizar mecanismo com "Botão de Pânico" para as vítimas.
- Dispõe sobre a implantação, em todo o território nacional, de aplicativo informatizado de fiscalização, em tempo real, das condições em que se encontram as mulheres sob ameaça ou em situação de flagrante violência.
- Dispõe sobre a proteção e apoio psicológico à mulher atleta vítima de violência física ou sexual.
- Cria o Banco Nacional de Boas Práticas na Prevenção e no Combate da Violência Contra a Mulher.
- Inclui na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional conteúdo sobre a prevenção da violência contra a mulher nos currículos da educação básica.
- Inlcui na Lei Maria da Penha permissão para que mulheres brasileiras, vítimas de violência doméstica no exterior, possam optar por seu domicílio original para os processos regidos por esta lei, e nele permanecer até a definição judicial.
- Acrescenta o art. 6º-A à Lei no 11.340, de 7 de agosto de 2006, para sujeitar o agressor de violência doméstica e familiar ao pagamento de multa.
- Dispõe sobre a prioridade para atendimento e emissão de laudos pelo Instituto Médico Legal e dá outras providências.
- Institui o Dia Nacional de Combate ao Feminicídio no Brasil e dá outras providências.