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MANCHETE: TSE cassa vereadores por repasse de cota feminina a candidatos homens



O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu cassar o mandato de dois vereadores de Rosário do Sul (RS) pela transferência de recursos destinados a campanhas femininas para candidatos homens. É a primeira vez que o TSE decreta a perda de cargo por esse tipo de prática.


A decisão foi unânime e, em seus votos, os ministros deram recados firmes de que a Justiça Eleitoral não aceita o mau uso de verbas destinadas à aumentar a participação feminina na política.


O caso envolve os vereadores Afrânio Vasconcellos da Vara e Jalusa Fernandes de Souza, ambos do PP. Jalusa recebeu R$ 20 mil do fundo partidário, mas repassou R$ 10 mil para o candidato a prefeito Alisson Furtado Sampaio, que não foi eleito, e R$ 2 mil a Afrânio. O Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul (TRE-RS) cassou o mandato dos dois vereadores, que recorreram ao TSE. Os ministros rejeitam o recurso.


Relator do caso, o ministro Luís Roberto Barroso disse que a reserva de percentual mínimo de recursos do Fundo Partidário para realizar programas de incentivo a participação de mulheres na política “constitui uma importante ação afirmativa em favor de mulheres, que tem por objetivo corrigir o problema da sub representação feminina na política”. O ministro afirmou que, por isso, não podem ser admitidos retrocessos. “Deve-se coibir e punir estratégias dissimuladas para neutralizar as medidas afirmativas implementadas”, falou.


“No caso em análise, a gravidade da conduta em razão da relevância jurídica das irregularidades ficou amplamente demonstrada. Primeiro, porque o percentual dos recursos do Fundo Partidário objeto de irregularidade em relação ao total de receitas em ambas as campanhas foi substancial e porque o valor recebido pelo candidato Afrânio em razão da doação representa 66% de suas receitas de campanha. O valor doado pela candidata Jalusa, R$ 12 mil, representa 53% de suas receitas”, disse o relator em seu voto, ressaltando que a decisão abre importante precedente na Corte eleitoral sobre o tema.


“A recalcitrância em dar cumprimento a medidas cujo objetivo é conferir efetividade a cota de gênero não pode ser minimizada, sob pena de que este tribunal superior venha a homologar práticas em franca colisão com os recentes avanços da jurisprudência do Supremo e do TSE destinados a superar o caráter meramente nominal da reserva de 30% de candidaturas para as mulheres”, falou Barroso.


Barroso rejeitos os argumentos dos vereadores de que a recém sancionada Lei da Anistia (Lei 13831/2019) não permite a cassação por desrespeito às regras de uso do Fundo Partidário para incentivar a participação feminina na política. Para o relator, a nova norma só vale para prestação de contas de partidos, não para fraudes nos valores efetuadas por candidatos.


“Seguem vigentes as ações de redução de desigualdade de gênero na política”, disse Barroso. O relator ainda destacou que a norma de utilização de 5% do fundo partidário para aumentar o quadro de mulheres candidatas já tem dez anos de existência, “tempo suficiente para que os partidos políticos tivessem incorporado políticas consistentes da participação da mulher na política”.


O ministro Edson Fachin, em seu voto, destacou a preocupação de Barroso com um retrocesso. ”Destaco a relevância, que está em mais de uma passagem do voto do ministro Barroso, da preocupação legítima com medidas que, de modo refratário, reponham o Estado anterior que era seguramente um estado que contribuía para a desigualdade de gênero, e não para numa sociedade aberta e plural como deve ser o Brasil, uma igualdade meramente formal”.


Já o ministro Jorge Mussi ressaltou que “as ilicitudes havidas na arrecadação e dispêndio representam uma das maiores causas de interferência na legitimidade do processo eleitoral”, comprometendo a isonomia entre os candidatos. “Dramático quadro de um país que possui uma baixíssima representatividade de mulheres em cargos políticos, apesar de contar com uma maioria de mulheres em sua população”, argumentou o ministro.


Única mulher do TSE, a ministra Rosa Weber caracterizou o processo como um “leading case” na Corte. “Há a necessidade de que esta decisão seja divulgada porque de certa forma o ser humano sempre engendra estratégias para desviar em condutas que não merecem a acolhida do direito, e que merecem ser coibidas pelo Poder Judiciário. E se nós temos políticas afirmativas de gênero, todas essas manobras engendradas pelas ações humanas para impedir essas ações merecem ser coibidas pelo Judiciário”, falou.

Outro precedente

O ministro Tarcísio Vieira, ao acompanhar o relator, falou que se trata de uma “segunda geração de fraude” nas candidaturas femininas, e lembrou de um caso de Valença do Piauí (PI), que foi suspenso por pedido de vista do ministro Og Fernandes. O caso, que deve voltar a ser julgado ainda neste mês, discute a cassação dos integrantes de uma coligação diante da constatação de uso de candidatas laranjas para cumprir a legislação que determina que pelo menos 30% dos candidatos devem ser do sexo feminino.


O caso pode pode indicar posições da Corte para o escândalo envolvendo o ministro do Turismo Marcelo Álvaro Antônio, do PSL, partido do presidente Jair Bolsonaro, que trata de supostas irregularidades no repasse de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha pelo PSL a candidatas a Assembleia Legislativa de Minas nas eleições de 2018. Álvaro Antônio nega irregularidades. Há expectativa de que o caso seja julgado na próxima semana, dia 22.


O ministro Tarcísio disse, em seu voto, que houve má-fé no uso dos recursos. “Neste caso, muito embora a candidata não possa ser considerada uma candidata laranja, mesmo porque ela se elegeu, o acórdão refratou com cores muito fortes a existência de má-fé na gestão desses recursos públicos que são muito escassos e extremamente relevantes no financiamento da democracia”, falou.


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