A pedido de Alcolumbre, texto é apresentado em comissão da Casa e pode ir a plenário em até duas semanas
O Senado voltou a discutir, nesta quarta-feira (12), uma proposta que endurece a lei de abuso de autoridade e que pode atingir o trabalho de investigadores. Na esteira das suspeitas de que o ex-juiz e atual ministro da Justiça, Sérgio Moro, teria orientado a força-tarefa da Lava Jato, senadores desengavetaram um projeto que trata do assunto e incluíram na pauta da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). A votação, porém, só deve ocorrer em até duas semanas.
O texto resgata a proposta das "10 medidas contra a corrupção", originalmente apresentada pela força-tarefa da Lava Jato, mas que foi desconfigurada na Câmara. Relator do projeto, o líder do DEM no Senado, Rodrigo Pacheco (MG), manteve a redação do que havia sido aprovado pelos deputados em 2016. O pedido para que a medida fosse discutida partiu do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP).
O projeto pune com reclusão de seis meses a dois anos condutas praticadas por autoridades ou agentes públicos "com a finalidade específica de prejudicar outrem ou beneficiar a si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, por mero capricho ou satisfação pessoal". Para se antecipar a críticas do Judiciário ao chamado "crime de hermenêutica", o relator colocou um dispositivo no texto determinando que a divergência na interpretação de lei ou na avaliação de fatos e provas não configura, por si só, abuso de autoridade.
Pacheco, porém, negou que a discussão tenha entrado em pauta em reação ao caso envolvendo Moro. "Não é uma resposta", disse o líder do DEM. "Esse projeto já estava no forno mesmo para ser apreciado, eu é que estava um pouco atrasado (com o relatório)", afirmou.
Acordo de líderes
De acordo com a presidente do colegiado, Simone Tebet (MDB-MS), o pedido para discutir a proposta foi feito ontem por Alcolumbre após acordo de líderes. PSL e Cidadania, no entanto, protestaram contra a retomada da proposta afirmando que não participaram da negociação.
Outros líderes de partidos ouvidos pelo Estado de maneira reservada confirmaram que parlamentares usaram o discurso de que há um "sentimento" para encampar o projeto em cenário de exposição da Lava Jato.
"O projeto serve para punir quem abusa. Se for uma reação suprindo o vazio na lei, é uma reação bem-vinda", disse o senador Renan Calheiros (MDB-AL), que apresentou em 2016 um projeto semelhante para punir o abuso de autoridade.
Para o líder do Podemos no Senado, Alvaro Dias (PR), uma mudança na legislação sobre abuso de autoridade só deveria ser discutida com o pacote anticorrupção apresentado em fevereiro por Moro, e não agora.
"Isso poderia induzir as pessoas a imaginar que esse projeto está sendo votado em razão do diálogo entre Moro e Deltan (Dallagnol, procurador em Curitiba) e, portanto, isso poderia significar para alguns que nós estamos votando um projeto de abuso de autoridade para limitar a ação de investigadores e julgadores, comprometendo os objetivos da Lava Jato", disse.
Para juristas ouvidos pelo Estado, não há possibilidade de a lei aprovada atingir Moro ou qualquer outra autoridade envolvida nas supostas trocas de mensagens. "Qualquer lei que leva a uma sanção penal ou civil não retroage. Não há chance de qualquer lei que venha a ser feita ou sancionada agora punir supostos crimes que ocorreram no passado", afirmou o presidente do Instituto Brasileiro de Direito Penal Econômico, Francisco Monteiro Rocha Júnior.