Procuradores se habituaram a usar aplicativos para falar sobre casos e até enviar documentos; agora há um receio crescente quanto à prática
A divulgação, no último domingo (9), de conversas de procuradores do Ministério Público Federal (MPF) deixou assustados integrantes do órgão. Antes daquele dia, era comum entre eles a discussão de casos investigados por meio dos grupos de chat das forças-tarefas e até mesmo o envio de documentos relativos às apurações.
De lá para cá, porém, vieram à tona indícios de que o suposto ataque de hackers foi mais amplo que se pensava. As notícias resultaram em um receio crescente de utilizar aplicativos de troca de mensagens.
A perda de um meio rápido de comunicação muito difundido entre procuradores poderá desacelerar investigações no curto prazo, disse ao Terra uma fonte do MPF. “Tem gente evitando conversar”, afirma.
Conforme os crimes foram se complexificando, tornou-se mais comum a formação de forças-tarefas com autoridades especializadas em áreas diferentes.
Um procurador especialista em lavagem de dinheiro e outro com conhecimentos em crimes digitais, quando trabalham juntos, precisam tirar as dúvidas uns dos outros, por exemplo.
Pelo que se sabe até agora, o provável ataque de hackers foi focado no Telegram. O aplicativo ficou famoso no país por ser a opção mais difundida ao WhatsApp, que saiu do ar por decisão judicial diversas vezes no Brasil.
Integrantes do Ministério Público Federal se habituaram a conversar por meio do Telegram porque ele era tido como seguro.
Além de grupos das forças-tarefas, os investigadores também têm grupos temáticos e de diversas outras naturezas.
O caso Vaza Jato
As reportagens que deram início ao caso foram publicadas pelo site The Intercept Brasil. Elas mostram conversas entre o coordenador da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, Deltan Dallagnol, e seus colegas.
Também têm diálogos entre Dallagnol e Sergio Moro. Atualmente, Moro é ministro da Justiça, mas na época era o juiz responsável pela operação no Paraná.
O ex-magistrado está sob pressão porque as mensagens sugerem que ele colaborou com a as apurações da Lava Jato, quando deveria se limitar ao julgamento. Moro nega irregularidades.
O site The Intercept Brasil afirma ter recebido o material de uma fonte na qual confia, e não explicou como as informações foram coletadas.
A hipótese de invasões de hackers nos celulares dos procuradores foi levantada pelas autoridades.
A extensão das invasões
As notícias publicadas desde a primeira reportagem de The Intercept Brasil falam em invasões de celulares de procuradores em vários locais do país.
O Terra apurou que, em São Paulo, ao menos dez teriam sido vítimas de tentativas de invasão – ainda não está claro se bem sucedidas. Na força-tarefa da Lava Jato na capital paulista, seriam no mínimo três. De início, não se sabia se era uma ação planejada ou ataques aleatórios.
Nos últimos dias os procuradores do MPF em São Paulo receberam instruções básicas de segurança digital da área de tecnologia do órgão.
Por serem mais visados, os procuradores que trabalham na Procuradoria Geral da República (PGR), em Brasília, tinham maiores preocupações com segurança. Segundo o órgão, não houve invasão bem sucedida em aparelhos de integrantes da cúpula do Ministério Público Federal.
Em dezembro do ano passado, foi lançado pelo MPF um aplicativo chamado E-Space. Sua função é fornecer uma comunicação segura entre os integrantes do órgão.
Os vazamentos de conversas de Dallagnol, porém, são anteriores ao desenvolvimento do programa. Além disso, até hoje o uso do E-Space não é muito difundido, em parte devido ao hábito de conversar pelo Telegram. O MPF planeja uma campanha para disseminar o aplicativo mais seguro entre seus membros.