Pesquisa publicada na Science indica que criação de áreas de preservação ambiental está longe de ser uma garantia eficiente de proteção
A criação de áreas de preservação ambiental está longe de ser uma garantia eficiente de proteção ao meio ambiente. A conclusão é do maior estudo internacional já feito sobre o tema, coordenado pela ONG Conservação Internacional, e publicado na revista científica Science. O trabalho destaca a situação do Brasil.
No País, 85 áreas de conservação foram extintas, reduzidas ou tiveram o seu status de proteção rebaixado. Foram 11,5 milhões de hectares ou cerca de 18% do que foi perdido globalmente. Outras 60 áreas são objeto de propostas ainda ativas e podem afetar outros 21 milhões de hectares.
O estudo avaliou as mudanças em todo o mundo entre 1892 e 2017. A conclusão é preocupante: há uma tendência mundial de retrocessos ambientais, acentuada na última década. Nos 125 anos analisados, 73 países promulgaram leis que resultaram na extinção de aproximadamente 52 milhões de hectares de áreas de conservação.
"A principal conclusão do estudo, para o mundo inteiro, é que as áreas protegidas não garantem a continuidade da proteção legal da biodiversidade dos serviços ecossistêmicos", afirmou o coautor do estudo Bruno Coutinho, da Conservação Internacional do Brasil. "Tampouco garantem a manutenção da cultura das populações tradicionais que habitam essas áreas."
O estudo frisa ainda que os números apresentados são estimativas conservadoras de reversões, já que os documentos legais continuam inacessíveis em muitos países.
"Estamos enfrentando duas crises ambientais globais: a perda da biodiversidade e a mudança climática. Para resolver ambas, os governos criaram áreas protegidas com a intenção de conservar a natureza perpetuamente", afirmou a principal autora do estudo Rachel Golden Kroner, da Conservação Internacional e da Universidade George Mason.
"Nossa pesquisa mostra que as áreas protegidas não são necessariamente permanentes e podem ser revertidas. As proteções perdidas podem acelerar o desmatamento florestal e as emissões de carbono, colocando nosso clima e nossa biodiversidade global em um risco ainda maior."
Na maioria dos casos (62% do total), a revisão das áreas de conservação está relacionada a obras de infraestrutura, mineração e agricultura. Outra importante conclusão do estudo sustenta que a criação das áreas de conservação segue processos longos, enquanto as revisões e extinções são feitas de forma bem mais simples.
"Em princípio, deveríamos ter os mesmos critérios rigorosos, sobretudo os estudos científicos, consultas públicas", explicou Coutinho. "Mas a maioria dos eventos que conseguimos rastrear ocorreu sem estudo e sem consulta. Ou seja, temos muitos critérios para criar, mas para reduzir, recategorizar ou extinguir não existem tantas exigências."
Coutinho explicou que o estudo não levou em conta a criação de unidades de conservação no mesmo período. "Sabemos que o Brasil ganhou muitas áreas de conservação, mas esse ganho não está nessa contabilidade; discutimos apenas os eventos de redução", afirmou. "Até porque o ganho pode ser em áreas muito diferentes das que foram perdidas e as perdas podem ser insubstituíveis."