Ordem dos Advogados do Brasil cobra 'pleno respeito' às normas da Constituição e afirma que a 'liberdade de imprensa é inegociável'
Entidades e especialistas saíram em defesa da liberdade de expressão e de imprensa, como reação ao desdobramento de inquérito do Supremo Tribunal Federal que investiga supostas ofensas e ameaças a ministros da Corte. À frente da investigação, o ministro Alexandre de Moraes determinou na segunda-feira, 15, à revista Crusoé e ao site O Antagonista a retirada do ar de reportagem que cita o presidente do Supremo, Dias Toffoli. Nesta terça, em nova decisão, Moraes mandou bloquear o acesso a redes sociais de sete investigados de espalhar mensagens com ataques aos ministros. Os sete também foram alvo de operação de busca e apreensão.
Em nota, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) disse ver com "preocupação" as decisões do Supremo e cobrou "o pleno respeito à Constituição Federal e a defesa da plena liberdade de imprensa e de expressão". "Nenhuma nação pode atingir desenvolvimento civilizatório desejado quando não estão garantidas as liberdades individuais e entre elas a liberdade de imprensa e de opinião, corolário de uma nação que deseja ser democrática e independente", afirma a entidade, que é presidida por Felipe Santa Cruz.
A entidade afirmou na sequência que nenhum risco de dano à imagem de qualquer órgão ou agente público, através de uma imprensa livre, "pode ser maior que o risco de criarmos uma imprensa sem liberdade, pois a censura prévia de conteúdos jornalísticos e dos meios de comunicação já foi há muito tempo afastada do ordenamento jurídico nacional". Ainda em referência à obrigação imposta a Crusoé e O Antagonista, a OAB disse que a "liberdade de imprensa é inegociável".
A reportagem em questão tem como base um documento nos autos da Operação Lava Jato. O empresário Marcelo Odebrecht encaminhou à Polícia Federal informações sobre codinomes citados nos e-mails apreendidos em seu computador, em que afirma que o apelido "amigo do amigo do meu pai" se refere a Toffoli.
O inquérito em que foram determinadas as medidas foi aberto por ordem do ministro Dias Toffoli, em 14 de março. Naquela data, houve um contra-ataque do Supremo ao que o ministro considerou como ameaças à segurança e ataques à honra dos integrantes da Corte.
'Paradoxal'
A advogada constitucionalista Vera Chemim classificou a situação como "paradoxal". "O STF veio na contramão do princípio de guardião da Constituição, a partir do momento em que determina por meio de um ministro (Alexandre de Moraes) não só a busca e apreensão em domicílio, como a questão da liberdade de imprensa." Ela lembra que a Constituição garante que é "livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença". Chemin afirma ainda que, "justamente em razão dessa garantia de a imprensa poder falar o que quiser, que se trata de uma questão de transparência e interesse público".
Na avaliação do jurista Roberto Dias, professor de direito constitucional da FGV-SP, além da inconstitucionalidade na decisão, a iniciativa vai contra entendimentos importantes do próprio Supremo. Ele ressalta que a Constituição proíbe "toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística".
Cientista político e professor do Insper, Fernando Schüler viu nas decisões de Moraes uma ameaça à liberdade de imprensa e de expressão. "Caso este procedimento seja mantido, qualquer cidadão ou órgão de imprensa saberá que seu direito de informar ou expressar uma opinião está sujeito à censura previa, a partir da interpretação monocrática e subjetiva de um ministro do Supremo", afirmou ele. "É evidente que isto não se sustenta. Parece que houve um grande equívoco nisso tudo, que logo será corrigido pelo próprio STF."