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BOMBA DO DIA: Presos de Presídio Federal em Porto Velho onde está Marcola do PCC estariam sendo dopa



Em outro presídio federal, o percentual de detentos tomando essas drogas chegaria a 80%; agentes penitenciários também sofreriam distúrbios


Em ao menos duas penitenciárias federais, construídas para isolar os criminosos mais perigosos do País, a maior parte dos detentos toma medicamentos psiquiátricos. A informação está em dois relatórios sobre as unidades de Porto Velho (RO) e Catanduvas (PR), aos quais o Terra teve acesso.


Dos 98 presos da Penitenciária Federal de Porto Velho, 50 usariam remédios do tipo quando a Defensoria Pública da União (DPU) vistoriou o lugar, em dezembro de 2018. Em fevereiro, a unidade recebeu o principal líder do Primeiro Comando da Capital (PCC) – Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola.


O uso dessas drogas descrito no relatório é muitas vezes maior que na população em geral. Estudo de 2015 mostra que na cidade de São Paulo, por exemplo, 5,89% das pessoas maiores de 15 anos tomavam medicação semelhante. Em 2013, outra pesquisa mostrou percentual de 6,55% no Rio de Janeiro.


Nas duas penitenciárias, os comprimidos são entregues duas vezes por semana em quantidade suficiente para os dias seguintes. Servem para tratar, por exemplo, a abstinência de drogas ilícitas que alguns usavam quando em liberdade ou em prisões estaduais.


Há quem os tome para dormir. Alguns já chegaram ao Sistema Federal usando esses remédios. Às vezes, internos tentam repassar comprimidos para colegas.

Chefão do PCC, Marcola foi enviado a Porto Velho porque o Sistema Federal tem segurança mais robusta. Em 2018, foi descoberto um plano da fação para libertá-lo da cadeia estadual onde estava, no oeste paulista.


Além do reforço na segurança externa, as penitenciárias federais também têm disciplina mais rígida. Os presos ficam isolados na maior parte do tempo. Passam apenas duas horas por dia fora das celas.


O contato com visitantes é reduzido. Também não há trabalho para os presos, que ajudaria a matar o tempo e ocupar a cabeça.

O regime disciplinar poderia ser um dos motivos para a necessidade do uso de medicamentos psiquiátricos, mas não há evidência conclusiva. O Ministério da Justiça nega a hipótese.


As informações sobre o consumo desses remédios estão em relatório de vistoria feito pela DPU. O Terra conseguiu o documento junto ao órgão por meio da Lei de Acesso a Informação (LAI).


O medicamento mais comum na unidade de Porto Velho é Clonazepam, mais conhecido pelo nome comercial Rivotril. No longo prazo, muitos remédios psiquiátricos podem causar dependência.


Entre os detentos, quatro teriam transtorno mental grave. Mais de 30%, de acordo com o relatório, tinham disfunções ligadas ao confinamento – como ansiedade e depressão.


Catanduvas

A quantidade de presos que usam remédios psiquiátricos em Porto Velho é grande, mas em pelo menos uma das outras quatro penitenciárias federais o consumo dessas substâncias é ainda mais amplo.


De acordo com relatório da DPU sobre a Penitenciária Federal de Catanduvas (PR) – também obtido via LAI –, entre 75% a 80% dos detentos da unidade usariam medicação psiquiátrica. A Defensoria visitou a cadeia no fim de agosto de 2018.



Catanduvas tem mais presos que a unidade de Porto Velho, 111 na época da vistoria – nenhuma das duas cadeias é superlotada. Entre os detentos na unidade paranaense, os problemas mais comuns são insônia e ansiedade.


Presos que fumavam maconha quando em liberdade ou em cadeias estaduais comumente passam da erva para psicotrópicos.


Ócio e distância da família também seriam causas frequentes para o uso. Um dos trunfos das unidades federais é poder manter os detentos até a milhares de quilômetros de seu local de origem, onde eles liderariam o crime organizado.


“Normalmente os problemas psiquiátricos que ocorrem dentro do sistema federal não se dão da mesma forma que acontece fora. Têm uma forma bem peculiar, seria um ‘CID [sistema de classificação de doenças] prisional’”, diz o relatório.


Segundo Alexandre Kaiser, defensor público que assina o relatório sobre a penitenciária de Porto Velho, os remédios são receitados por médicos. “O controle dos presídios federais é bem rigoroso. Mesmo os que têm prescrição médica em alguns casos eles fazem uma filtragem. Drogas [entrando em penitenciárias federais], eu, pelo menos, nunca tive notícia”.


As administrações dos presídios mantêm farmácias dentro das unidades. Alguns medicamentos são fornecidos pelo SUS. As famílias dos detentos e os conselhos de comunidade também podem ajudar no fornecimento de remédios – mas são casos raros, de acordo com o Ministério da Justiça, responsável pelo Sistema Federal.


Eventualmente presos são atendidos por médicos de fora do presídio, mas em geral os remédios são receitados por profissionais da cadeia.

O Ministério da Justiça nega que o regime disciplinar das cadeias federais causem distúrbios. Eles seriam, segundo o órgão, fruto do “estilo de vida pretérito dos internos”.


Diz, porém, que pode haver crises de abstinência em alguns presos – é praticamente impossível a entrada de drogas nessas unidades.


“Grande parcela dos presos fazia uso (muitas vezes abusivo) de tabaco, maconha, cocaína, álcool e medicação psicotrópica desde tenra idade”, afirmou o ministério em nota enviada à reportagem.


“Esse quadro é puramente fisiopatológico e devidamente tratado por psiquiatra com utilização medicamentos prescritos e fornecidos pelo Sistema Penitenciário Federal”, diz o texto.


Por que tanto remédio?

Apesar das hipóteses para as causas de tamanho uso de remédios psiquiátricos, não há informação conclusiva. De acordo com Kaiser, trabalhos científicos sobre esse tema são raros em presídios federais.


A Defensoria Pública planeja uma investigação mais elaborada sobre a saúde mental dos presos no Sistema Federal.


“Existe uma preocupação porque o índice de utilização [dos remédios] é muito maior que da população em geral. Isso tem de ter um motivo”, explica Kaiser.

De acordo com o professor do Departamento de Psiquiatria da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) Sérgio Andreoli, transtornos mentais em prisões são comuns no mundo todo, não só no Brasil.


Ele estudou a saúde mental de detentos do sistema estadual de São Paulo. "O que chamou mais a atenção foram os transtornos graves."

As prisões estaduais, porém, têm realidades muito diferentes das federais. No sistema federal não há superlotação, e as condições materiais são incomparavelmente melhores.


"Provavelmente eles são mais cuidados, recebem remédios. Nos presídios estaduais nem sequer são identificados [os presos com distúrbios]", disse Andreoli ao Terra.


O professor da Unifesp é um dos responsáveis pelos dois estudos citados no começo desta reportagem, com números sobre o uso de psicotrópicos em São Paulo e no Rio de Janeiro.


Perguntado se a rígida disciplina das penitenciárias federais pode ser causa do alto uso de remédios psiquiátricos, o professor diz ser plauísvel, mas faz uma grande ressalva: "É uma explicação muito superficial'.


Ainda, é possível que haja uma sobremedicação. Esse fenômeno acontece fora das cadeias também. Trata-se da recomendação de um tratamento mais forte que o necessário para determinado distúrbio – como receitar um remédio para problema que poderia ser tratado com terapia e atividade física, por exemplo.

Em entrevista à DPU, a psiquiatra da penitenciária de Porto Velho (seu nome não é citado no documento) também manifestou preocupação com a saúde mental de outro grupo.


De acordo com ela, os agentes penitenciários não recebem preparo adequado para as situações de estresse às quais são submetidos cuidando dos criminosos mais perigosos do Brasil.


No documento relativo a Catanduvas, a Defensoria recomendou a implementação de um plano para acompanhar a saúde dos servidores.


Ambos os relatórios citados neste texto foram apresentados ao diretor do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), Fabiano Bordignon, em 22 de fevereiro. Ele demonstrou boa vontade com os defensores públicos presentes na reunião, apurou a reportagem.


STF liberou permanência de presos

Em tese, as penitenciárias federais servem para isolar líderes de facções enquanto as autoridades estaduais se organizam para receber os líderes novamente em seus presídios, em condições melhores para combater as organizações criminosas.


Até o começo de março havia uma disputa na Justiça para saber se detentos poderiam ficar mais de dois anos no Sistema Federal. A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal liberou a permanência por períodos prolongados.


A decisão agradou muitos governadores. Os Estados não precisam se preocupar tanto com seus presos mais perigosos quando eles estão no Sistema Federal.

Em Porto Velho, por exemplo, um dos presos estava encarcerado no Sistema Federal havia mais de 8 anos quando da vistoria da DPU.

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