Nova resolução, que entra em vigor em maio, cria regras para atendimentos online, como a necessidade do 1º contato presencial
Médicos poderão realizar consultas, diagnósticos e outros atendimentos a distância, por meio da internet, a partir deste ano.
Uma nova resolução do CFM (Conselho Federal de Medicina) sobre telemedicina está prevista para ser publicada nesta semana. A norma entrará em vigor em maio.
Até então, a única exceção era quando médicos realizavam contato —em videoconferência, por exemplo— com colegas especialistas em outros locais durante os procedimentos, em uma espécie de segunda opinião.
Agora, resolução do conselho prevê que esse tipo de atendimento online possa ser realizado também entre médicos e pacientes que já tiveram ao menos uma consulta prévia anterior.
Alguns hospitais já usavam a telemedicina de forma experimental — um projeto no Hospital de Câncer de Barretos, no interior paulista, usou fotos enviadas por e-mail para facilitar o diagnóstico de câncer de pele, um grupo da Unifesp realizou a detecção de problemas na retina e de glaucoma com a ajuda de fotos.
Para o conselho, a medida representa um novo marco no exercício da medicina. “O paciente podia tirar alguma dúvida por WhatsApp, mas não existia a possibilidade de consulta”, afirma o relator da norma, Aldemir Soares.
O atendimento virtual, porém, deve obedecer a alguns critérios. A primeira consulta deve sempre ocorrer de forma presencial. “Mas quando o paciente vai só para mostrar exames ou se já tem histórico de atendimento, ele poderá fazer isso a distância”, diz.
A exceção são comunidades remotas, como áreas próximas a florestas, em que o primeiro atendimento também pode ser virtual. Para isso, o paciente precisa estar acompanhado de outro profissional de saúde.
No caso de atendimentos longos ou de pacientes com doenças crônicas, a norma prevê ainda que haja ao menos uma consulta presencial a cada quatro meses.
Profissionais deverão manter ainda arquivos de cada atendimento prestado a distância, em uma espécie de prontuário médico virtual. A gravação deve ser autorizada pelo paciente —caso não haja consentimento, a teleconsulta não poderá ser realizada.
Outra exigência é que o médico mantenha o sigilo dos atendimentos.
Caso o profissional verifique que há risco de diagnóstico de doença grave, a consulta pode ser interrompida para avaliação presencial. “Caberá aos médicos verificar seus limites para atuar desse jeito, além dos limites de cada caso”, afirma Soares.
O documento do CFM estabelece ainda critérios para a realização de outros atendimentos, caso do telediagnóstico e da telecirurgia.
O primeiro prevê que médicos avaliem exames e elaborem laudos a distância, desde que haja um profissional de saúde do outro lado para ajudar o paciente e equipamentos específicos.
Já o segundo prevê que os médicos conduzam cirurgias com uso de robôs e outras tecnologias. Neste caso, o paciente deve ser acompanhado por um médico especialista do outro lado para evitar problemas e falhas de assistência —em casos de queda de energia, por exemplo.
Para Soares, a resolução visa garantir a segurança desses procedimentos.
De acordo com o CFM, enquanto os exames a distância têm se tornado mais comuns, especialmente no caso da radiologia, ainda há poucos registros de telecirurgias no Brasil.
“Vemos que está aumentando o uso de robôs para cirurgia. Com o médico no local, temos a garantia de que a cirurgia irá até o final caso haja alguma intercorrência”, diz.
Ao mesmo tempo em que representa uma abertura para uma atuação na era digital, a possibilidade de oferecer consultas e outros atendimento a distância tem sido alvo de preocupação entre grupos de médicos nas redes sociais.
O pontapé para o debate veio de anúncios, na internet, de serviços de consulta virtual ou “teleorientação” oferecidos por alguns hospitais.
O temor é que esse tipo de atendimento, por não envolver o exame físico, possa levar a avaliações equivocadas ou atrasar diagnósticos.
A situação levou o próprio CFM a divulgar uma nota nesta semana em que afirma que o exame presencial “é a forma eficaz e segura de se realizar o diagnóstico e tratamento de doenças”.
Questionado se a nova norma não contraria a posição recente do próprio conselho e do Código de Ética Médica, o qual veda procedimentos sem exame direto do paciente, Soares nega.
“O código já previa que a telemedicina fosse regulamentada”, afirma. “Precisávamos disciplinar como funciona, senão cada um montaria do seu jeito, e aí o perigo seria maior.”
Ele diz que a medida deve ser aplicada em casos específicos. “A consulta presencial, com exame físico completo, ainda é o fundamental da medicina”, diz. “Uma dificuldade de trânsito, por exemplo, não justifica montar uma consulta virtual para isso.”
Ainda de acordo com Soares, casos de violação às normas podem ser denunciados aos conselhos regionais de medicina.
Para o presidente do CFM, Carlos Vital, a nova resolução deve facilitar atendimentos no SUS, sobretudo em regiões remotas e onde há dificuldade em atrair profissionais.
Hoje, ao menos dez estados já possuem atendimentos de telediagnóstico no SUS, segundo o Ministério da Saúde. As ações fazem parte do programa Telessaúde, iniciado em 2007.
As teleconsultorias têm sido usadas no Rio Grande do Sul como forma de aumentar a efetividade da atenção primária e reduzir as filas de espera por especialistas no SUS.
Entenda o atendimento médico a distância
Como era até então Telemedicina era realizada apenas entre médicos, como uma segunda opinião. Alguns hospitais universitários já usavam a modalidade, mas em caráter experimental
O que muda
Nova resolução define a prática de teleconsulta e estabelece regras, como necessidade de que o primeiro atendimento seja presencial. Estabelece ainda intervalo de no máximo quatro meses para consultas presenciais —no caso de pacientes crônicos, por exemplo.
Também prevê que atendimento seja gravado e armazenado seguindo critérios, com proteção garantida para sigilo. Caso paciente não concorde com a gravação, consulta não pode ser realizada
Caso o médico prescreva exames e medicamentos, documento deve conter dados de identificação, registro de data e hora e assinatura digital do médico
Na telecirurgia, os procedimentos devem ocorrer em espaços com infraestrutura, com médico que opere equipamento robótico e outro que acompanhe o paciente no local
Glossário da telemedicina
Telemedicina Termo usado para definir o exercício da medicina mediado por tecnologias para fins de assistência, educação, pesquisa, prevenção de doenças e lesões e promoção de saúde
Teleconsulta É a consulta médica mediada por tecnologias, com médico e paciente em diferentes locais
Teleinterconsulta Ocorre quando há troca de informações e opiniões entre médicos para auxílio diagnóstico ou terapêutico, clínico ou cirúrgico
Telediagnóstico Consiste na emissão de laudo ou parecer de exames pela internet
Telecirurgia É um procedimento feito por um robô ou outra tecnologia manipulada por um médico que está em outro local, desde que com presença de outro médico, com a mesma habilitação do cirurgião remoto, que possa atuar no caso de intercorrências
Teleconferência cirúrgica Feita por videotransmissão, é permitida desde que o grupo receptor das imagens, dados e áudios seja formado por médicos
Teletriagem médica Ocorre quando o médico faz uma avaliação, a distância, dos sintomas para a definição e direcionamento do paciente ao tipo adequado de assistência necessária
Telemonitoramento Permite que um médico avalie a distância as condições de saúde dos pacientes. Pode ser usada em casas de repouso para idosos ou em comunidades
terapêuticas
Teleorientação Preenchimento a distância, pelo médico, de declaração de saúde para a contratação ou adesão a um plano de saúde
Teleconsultoria Permite troca de informações entre médicos, gestores e profissionais de saúde sobre procedimentos e ações de saúde
Fontes: Resolução 1.643/2002 e resolução 2.227/2018