250 processos estão paralisados, Duração da medida não foi divulgada
Incra: ‘Para realização de diagnóstico’ ‘Visa proteger latifundiários’, diz MST
As superintendências regionais do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) receberam na última 5ª feira (3.jan.2019) memorandos determinando a interrupção de todos os processos de aquisição, desapropriação ou outra forma de obtenção de terras para o programa nacional de reforma agrária no país.
A informação foi divulgada em reportagem da ONG Repórter Brasil. Segundo o Incra, 250 processos em andamento estão suspensos.
Em nota, o instituto afirmou que a interrupção é temporária, mas não informou o prazo de duração da medida.
“Memorandos das Diretorias de Obtenção de Terras e de Ordenamento da Estrutura Fundiária do Instituto determinaram o sobrestamento temporário dos processos administrativos para realização de diagnóstico dos processos de obtenção de terras e de regularização fundiária em andamento nas superintendências regionais nos Estados”, diz a nota.
Eis 1 memorando que circulou:
O Incra, que estava vinculado à Casa Civil desde 2016, está agora subordinado à Secretaria de Assuntos Fundiários, vinculada ao Ministério da Agricultura, por medida provisória e decreto assinados pelo presidente Jair Bolsonaro.
A pasta é comandada pela ministra Tereza Cristina (DEM-MS) e abriga a Secretaria de Política Agrária, chefiada por Nabhan Garcia. Ambos são ruralistas.
Para 2 funcionários do Incra ouvidos pela Repórter Brasil, que pediram para não serem identificados, a medida revela a intenção do novo governo de acabar com a reforma agrária.
Há também quem avalie que a suspensão é uma maneira de o governo ganhar tempo até serem editadas medidas que favoreçam o agronegócio.
Criado em 1970, o Incra contabiliza 1,34 milhão de famílias assentadas no programa de reforma agrária em 9.400 assentamentos criados e reconhecidos em 88 milhões de hectares. Atualmente, 972 mil famílias vivem em assentamentos e área reformadas.
O orçamento do instituto sofre cortes desde 2015, quando era de R$ 2,5 bilhões. Para 2019, a Lei Orçamentária Anual traz a previsão de gastos de R$ 762 milhões –1 corte de 70% em 4 anos.
OUTROS MEMORANDOS
Segundo a reportagem, um 2º memorando, também enviado em 3 de janeiro, determina que as superintendências regionais disponibilizem, até esta 4ª feira (9.jan.2019), a relação de todos os imóveis que podem ser destinados para a reforma agrária.
O documento informa que as mudanças se devem à alteração na estrutura do Incra.
“A equipe de transição da nova estrutura necessita conhecer a demanda existente no tocante a obtenção de imóveis rurais a serem incorporados ao Programa Nacional de Reforma Agrária”, diz o memorando.
A reportagem teve acesso ainda a um 3º memorando, que reforça o pedido para suspender os processos de compra e de desapropriação de terras, com exceção daqueles que tramitam na Justiça.
Segundo o documento, a medida também vale para as áreas da Amazônia Legal, que inclui 9 Estados banhados pela bacia hidrográfica do Rio Amazonas.
Os 2 primeiros memorandos foram assinados pelo ex-diretor do Incra, Clovis Figueiredo Cardoso (MDB), indicado na gestão do ex-presidente Michel Temer. Segundo a reportagem, Clóvis foi exonerado após a divulgação dos documentos.
Já o 3º documento foi assinado por Cletho Muniz de Brito, diretor de ordenamento da estrutura fundiária do órgão.
O QUE DIZ O MST
Para Alexandre Conceição, da direção nacional do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), a medida agravará os conflitos em relação à reforma agrária.
“O Brasil é o 2º maior país em concentração de terra, ficando atrás apenas do Paraguai, logo, atitudes como essa tem como principal objetivo proteger esses latifundiários em detrimento das mais de 120 mil famílias acampadas. É uma opção do atual governo”, afirmou, em nota.
Segundo Conceição, ao contrário do que se diz, a luta pela terra é inerente a qualquer governo, e incide sobre uma reação natural ao desemprego, ao não desenvolvimento e a desigualdade social.
“A cultura latifundiária no Brasil subiu ao poder com o único objetivo de concentrar terra e aumentar ainda mais a desigualdade social. Esse é mais 1 passo do governo que vai caminhar em direção a extinção da Reforma Agrária”, afirmou.
“Ainda assim, a luta pela terra não vai cessar por conta dessa medida. Nós repudiamos veementemente essa atitude do atual governo que, embora não nos surpreenda, será combatida. De nossa parte vamos continuar organizados, lutando e denunciando no Brasil e no mundo a situação agrária no país”, completou.