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ALFINETADA: Receita cobra de ministro do TCU, impostos sobre suposta propina

Órgão apontou débito de R$ 1,2 milhão, o que fez investigadores considerarem o suborno comprovado



A Receita Federal notificou o ministro Augusto Nardes, do TCU (Tribunal de Contas da União), e determinou que ele pague impostos e multa por supostamente receber, sem recolher tributos, R$ 2,5 milhões —dinheiro que, segundo investigação, corresponde a uma propina de esquema de corrupção no Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais).


Conforme Operação Zelotes, Nardes obteve o dinheiro para recrutar um grupo de lobistas que comprou decisões do órgão favoráveis à RBS, conglomerado de comunicação que atua no Sul. Os julgamentos supostamente fraudados anularam um débito que ultrapassa R$ 1 bilhão em valores atualizados.


Em 2001, a RBS foi autuada pela Receita a pagar R$ 258 milhões após uma fiscalização apontar que o grupo deixou de recolher tributos referentes a ganho de capital na compra e venda de participações em empresas.


O recurso do grupo não prosperou, e o caso foi parar no Carf, espécie de segunda instância da Receita. Pelo relatório, em 2005, Nardes, então deputado federal pelo PP gaúcho, foi quem apresentou a RBS à SGR Consultoria, empresa cujos representantes teriam pago propina a integrantes do conselho.


Em março daquele ano, uma empresa do ministro, a N&P Planalto Soluções e Negócios, fez um contrato de parceria com a SGR para prestar consultoria e assessoria à RBS.


De acordo com a investigação, os serviços não foram prestados e o contrato visava dar fachada legal a pagamentos ilícitos.

A RBS ganhou a causa em março de 2011. Uma planilha apreendida na SGR relaciona pagamentos em espécie a Nardes, identificado no documento como "tio", e a Juliano Nardes, seu sobrinho e sócio, entre dezembro de 2011 e fevereiro de 2012. As datas coincidem com as de cheques descontados pela empresa em sua conta bancária.


Anotações dos investigados sobre a repartição de R$ 12,7 milhões repassados pela RBS à SGR também descrevem o pagamento de R$ 2,5 milhões a "ministro".

A investigação sobre o caso aponta que, após o fim do processo no Carf, em 2011, Nardes passou a receber valores em espécie. O montante supostamente entregue ao ministro consta de planilha de controle de pagamentos, emails e anotações dos lobistas.


Nardes nega ter recebido os recursos e atuado na compra de conselheiros, mas confirmou a autuação da Receita.


O auto de infração, com o valor definitivo cobrado do ministro, é sigiloso. Segundo pessoa com acesso ao caso, um dos cálculos feitos pelos fiscais da Receita apontou, entre impostos, juros e multa, débito de R$ 1,2 milhão.


Para investigadores, a notificação da Receita significa que o fisco reconhece que o ministro recebeu o dinheiro.

No último dia 30, 14 pessoas, entre empresários, ex-integrantes do conselho e advogados, foram denunciadas por corrupção e lavagem de dinheiro por supostamente favorecer a RBS no Carf.


Nardes não está entre os acusados, pois tem foro privilegiado e é alvo de um inquérito que tramita à parte no Supremo. A Procuradoria-Geral da República avalia denúncia contra ele.


As informações sobre o caso, obtidas pela Folha, constam de relatório da Coordenação-Geral de Procedimentos Especiais (Coger), braço da corregedoria do Ministério da Fazenda que subsidiou as denúncias apresentadas na Zelotes, entre elas as acusações contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) por, supostamente, vender medidas provisórias.


O ministro do TCU sustenta que apenas indicou a RBS para a SGR como cliente potencial e que se desligou de sua empresa de consultoria em maio de 2005, não tratando mais do assunto.


Para os investigadores, sua participação foi mais ampla, tanto que constam reuniões com ele após o suposto desligamento.

Um e-mail enviado a José Ricardo da Silva, um dos donos da SGR denunciados pela Procuradoria, por uma de suas funcionárias registrou reunião com “ministro Augusto Nardes” e representantes do escritório em 31 de outubro de 2011, dias antes de os supostos pagamentos começarem a ser feitos. Também constam registros telefonemas de Nardes ao escritório na época.


Um dos sócios da consultoria, João Batista Gruginski, fez em junho de 2011 espécie de ata de uma reunião da empresa, na qual escreveu: “Lembrou-se, também, que Nardes, juntamente com seu sócio [Clorimar] Piva, tem parte que suponho igualitária (Nardes que ajudou captar o contrato). Recebi o processo para fazer os cálculos”.


OUTRO LADO

Em nota à Folha, Nardes afirmou que "todos os esclarecimentos" sobre a autuação já foram prestados à Receita. "O processo administrativo, de cunho sigiloso, está ainda em fase de contraditório e não há manifestação definitiva da Receita sobre a matéria."


O ministro informou que não teve acesso ao teor da denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal, mas que "abriu mão dos direitos de acionista da empresa N&P ao se desligar dela em 2 de maio de 2005, antes mesmo de assumir a vaga no TCU".


"De acordo com notícias veiculadas na mídia, os fatos investigados teriam ocorrido entre 2011 e 2012", disse.


"O Grupo RBS emitiu nota afirmando que 'jamais celebrou qualquer tipo de contrato nem manteve qualquer vínculo profissional de espécie alguma com a empresa N&P Planalto Soluções e Negócios, pessoas a ela vinculadas ou com o ministro do TCU Augusto Nardes", acrescentou o ministro.


A Folha não localizou Juliano Nardes. O ministro disse à reportagem ter entrado em contato com seu sobrinho e que ele informou que não se manifestaria.

A RBS, em nota, afirma que o processo no Carf tramitou e foi examinado por mais de 11 anos até a decisão final. "Durante esse longo período, como é normal em qualquer grande empresa em processos relevantes, o Grupo RBS contratou um conjunto de profissionais e pareceristas para fazer sua defesa."


"A RBS informa que mantém todos os seus impostos em dia e reafirma que agiu e age com absoluta lisura em todos os seus procedimentos tributários. A empresa manifestou sua inconformidade com a autuação da Receita e salienta que todos os honorários advocatícios relacionados à sua defesa no processo foram, como sempre, devidamente contabilizados e informados às autoridades competentes, com o recolhimento de todos os impostos."


O grupo reiterou sua "disposição para colaborar na elucidação de qualquer questionamento pelas autoridades legais".


O advogado de José Ricardo da Silva, Marlus Arns, afirmou que não foi intimado e que apresentará a defesa no processo. João Batista Gruginski disse que só se pronuncia nos autos.

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