Guerra civil síria matou meio milhão e gerou 5 milhões de refugiados
Ninguém mais liga mais para a guerra da Síria, que desde março de 2011 já matou meio milhão de pessoas e transformou mais de cinco milhões em refugiados, enquanto a comunidade internacional continua gerindo seus interesses na região, o que é indecente. Um dos dramas da Síria é ser uma passagem que as grandes potências mundiais lutam para controlar. O conflito até já deixou de ser manchete. Foi banalizado, para usar a linguagem de Hannah Arendt.
No último fim de semana, houve novo ataque com gás cloro em Alepo. Cerca de 100 civis intoxicados, mas pouca atenção mereceu dos líderes europeus e da imprensa. Segundo o Observatório Sírio dos Direitos Humanos, forças do governo também lançaram rockets contra a cidade de Jarjanaz, matando seis crianças que saiam da escola.
O regime sírio responsabiliza terroristas. Os rebeldes acusam Bashar al-Assad de ter encenado a operação, sob instruções da Rússia, para culpar adversários. Atualmente, o caos da guerra impede investigação independente, o que somente acontecerá após seu término. A Comissão para a Justiça Internacional e Responsabilização vem reunindo provas dos crimes cometidos na Síria.
Graças ao filme “Guerra Pessoal “, sobre a vida e morte da corajosa da jornalista Marie Colvin, o tema voltou à atualidade. O diretor Matthew Heineman fez um documentário sobre sua trajetória profissional, atualmente exibido nas salas europeias de cinema. Jornalista americana e correspondente de guerra do britânico The Sunday Times, Marie foi assassinada na cidade de Homs pelos mísseis de Assad, ao lado do fotógrafo francês Rémy Ochilik
Em Portugal, ao contrário do normal, ninguém sai antes do término da exibição dos créditos do filme. As pessoas querem conhecer os detalhes da sua produção e quem são os responsáveis pela denúncia documentada. Ao final, aparentemente chocadas, deixam a sala em silêncio. É possível que se indaguem como tudo isso tem sido possível ao longo de sete anos, sem que até aqui os atores internacionais não tenham posto fim ao cenário de barbárie.
Colvin era uma jornalista que se preocupava como raros em denunciar os horrores das guerras. Cobriu muitas. Desde meados da década de 80 esteve nas trincheiras dos maiores conflitos mundiais. Perdeu o olho esquerdo num ataque surpresa em Siri Lanka.Enfrentou corajosamente todas as dificuldades para estar sempre na linha da frente. Aos 56 anos, não se intimidou diante de nada para denunciar as atrocidades cometidas por Assad contra civis inocentes, como crianças, mulheres e idosos.
Ganhou diversos prêmios em sua carreira. Mas escolheu colocar-se a serviço da denúncia, para informar o mundo o que testemunhava nas frentes de combate ao invés de permanecer na tranquilidade londrina. Na véspera do seu assassinato, transmitiu reportagem em direto para a CNN, numa sala improvisada de imprensa, mostrando imagens terríveis de um bebê assassinado em frente às câmaras.
Alertada para o perigo da transmissão, que facilitaria sua localização pelos drones sírios, fez o que julgou ser seu dever. Assim, assinou sua sentença de morte. Assad nunca negou o fato. Despreza jornalistas. Sobre a morte de Marie, disse apenas que ela estava acompanhada de terroristas e sabia o que estava fazendo. Não estava com terroristas, mas sabia o que fazia.
Sabe-se disso e que o irmão do ditador, Maher al-Assad, é o responsável pelos massacres e carnificinas e que subornou uma mulher com um automóvel novo para denunciar a jornalista e seus colegas, através de um desertor dos serviços secretos sírios, codinome Ulysses. Essas e outras informações só vieram à tona porque a família de Marie Colvin acionou a Justiça contra os Assad e exige milhões de dólares de indenização.
O filme contrasta com indiferença dos líderes mundiais diante da guerra síria e sua continuação, sustentada pela Rússia, Irã e potências mundiais que vendem armamento para os países que alimentam o terrorismo. É a história de uma jornalista que não virou a cara à violência e acreditava no seu trabalho como um dever mais precioso do que sua vida. Marie Calvin é um exemplo para todos nós jornalistas. Vale a pena ver o filme.