Acordo de cooperação técnica prevê que cada parte vai arcar com suas próprias despesas, sem transferência de recursos financeiros
Num momento em que falta trabalho para 27,7 milhões de brasileiros, dos quais 12,9 milhões estão efetivamente desempregados, o governo do presidente Michel Temer se prepara para começar a cobrar pela emissão da carteira de trabalho. O documento, historicamente, é 100% gratuito aos trabalhadores.
O Ministério do Trabalho e os Correios elaboraram um acordo de cooperação técnica em que se transfere aos Correios a responsabilidade pela carteira. No acordo, ficou expresso que o documento terá um custo ao empregado, com possibilidade de reajustes anuais ao longo dos cinco anos previstos para a parceria.
O acordo foi costurado pelo ministro do Trabalho, Caio Vieira de Mello; pelo secretário-executivo da pasta, Admilson Moreira; e pelo presidente dos Correios, Carlos Fortner. No fim de julho, o governo chegou a tornar pública a parceria para transferir aos Correios a emissão do documento, tendo São Paulo como projeto piloto. O que não se disse na ocasião é que o acordo de cooperação técnica prevê a cobrança para a obtenção da carteira. Um valor em discussão é de R$ 15.
Dentro do Ministério do Trabalho, depois de a cúpula da pasta costurar o acordo, a proposta passou a enfrentar a oposição da área técnica. Até agora, dois pareceres já foram elaborados contra a iniciativa de cobrança.
Primeiro, o setor diretamente responsável pelos documentos elaborou nota técnica contrária ao acordo e ao pagamento para a emissão da carteira. O parecer argumenta que a legislação vigente estabelece a gratuidade do documento.
Diante da pressão do ministro e do secretário-executivo, que defendem o acordo, uma nova nota técnica foi elaborada, com o mesmo teor, para corroborar o primeiro entendimento técnico. Este último parecer foi subscrito por três áreas relacionadas a emprego no ministério. Os pareceres foram enviados à Consultoria Jurídica da pasta.
O país tem hoje cerca de 2,5 mil postos de emissão de carteira de trabalho, como unidades do Sine e agências do ministério. Desses 2,5 mil postos, cerca de 400 fabricam o documento.
Somente nos cinco primeiros meses do ano, o Ministério do Trabalho emitiu 2,3 milhões de carteiras em todo o país. Se o preço em análise já estivesse em prática, somente essas emissões teriam rendido R$ 34,5 milhões aos Correios.
O acordo de cooperação técnica prevê que cada parte vai arcar com suas próprias despesas, sem transferência de recursos financeiros.
Na mesma cláusula, o acordo é claro: os Correios devem ser remunerados pelo atendimento prestado e, para isso, poderão estipular o valor do serviço para cada atendimento. Caberá aos interessados pela carteira custearem pelo serviço.
A cobrança pela carteira de trabalho passou a ser um assunto corrente dentro do Ministério do Trabalho. O secretário-executivo da pasta costuma dizer que "um valor simbólico" será cobrado, com a efetivação do acordo de cooperação. Os técnicos enxergam uma vedação legal no pagamento pelo documento, em qualquer circunstância.
O valor seria definido num anexo a ser elaborado. Os Correios vêm fazendo uma ofensiva no sentido de fazer valer a parceria.
O último dado sobre emprego, divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostra que o Brasil é um país com quase 13 milhões de desempregados. Deste total, 3,16 milhões procuram emprego há mais de dois anos.
Ao GLOBO, por meio da assessoria de imprensa, os Correios afirmaram que a proposta enviada ao ministério “está em processo de validação pelo órgão” e que, somente após a “aceitação”, “serão definidos os parâmetros para a precificação do serviço”. “Os Correios aguardam o posicionamento do Ministério do Trabalho sobre a proposta para iniciar as ações operacionais, como integração de sistemas, entre outras ações.”
O Ministério do Trabalho não respondeu aos questionamentos até a publicação desta reportagem.