Nos últimos meses, o Congresso, o STF e o Planalto têm tomado decisões que afetam serviços concedidos à iniciativa privada, o planejamento de estatais e ampliam a ingerência política em agências reguladora
Um caso relacionado à cobrança de pedágio ilustra como decisões contraditórias do governo federal, do Congresso e do Judiciário vêm afetando o investimento em infraestrutura no País. A concessionária NovaDutra, por exemplo, teria de triplicar o valor do pedágio na rodovia que liga São Paulo ao Rio caso Câmara e Senado venham a aprovar proposta isenta de tarifa moradores e trabalhadores de cidades onde estão localizadas as praças de pedágio. Este é apenas um dos 182 projetos atualmente em discussão no Congresso Nacional que oferecem benefícios a usuários específicos.
Desde junho, não só a NovaDutra, mas todas as concessionárias foram obrigadas a isentar caminhões vazios. Essa foi uma das concessões do governo federal aos caminhoneiros, na época da greve da categoria. A regra já vale para rodovias federais, estaduais e municipais, mesmo as que foram concedidas, o que quebra contratos de vias como a Dutra, que desde 1996 pertence à iniciativa privada. O governador de São Paulo, Márcio França, entrou na Justiça para cobrar o ressarcimento por essa isenção da União.
Riscos em série. A Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib) mapeou 20 exemplos de risco jurídico em diferentes áreas. Além de rodovias, também são alvo de decisões que geram insegurança jurídica as áreas de energia, saneamento, portos e aeroportos, entre outras. A lista foi enviada aos candidatos à Presidência como um alerta ao próximo governo.
Para a Abdib, a proximidade das eleições e a fragilidade do governo Temer têm elevado essa insegurança. A entidade avalia que, após o impeachment de Dilma Rousseff, Michel Temer assumiu com forte articulação entre os parlamentares. No entanto, esse apoio se esvaiu, favorecendo decisões contraditórias do Congresso, do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal de Contas da União (TCU) que afetam contratos previamente firmados.
“O fato de não termos um governo articulado reforça a hipertrofia de outros órgãos”, diz o presidente da Abdib, Venilton Tadini, lembrando que o momento pré-eleitoral reforça essa tendência. Para o diretor de políticas e estratégias da Confederação Nacional da Indústria (CNI), José Augusto Fernandes, a percepção de risco jurídico amplia os custos das negociações empresariais.
Fernandes cita que regras têm sido criadas sem apuro técnico – caso do tabelamento dos fretes, outra resposta à greve dos caminhoneiros. “Essa lei vai gerar inúmeras batalhas jurídicas”, prevê.
Outro exemplo de decisão que afeta as empresas veio do ministro Ricardo Lewandowski, do STF, que impediu a privatização de estatais, controladas e subsidiárias sem aval do Congresso. A liminar levou à suspensão da venda de refinarias da Petrobrás, afetando o programa de desinvestimento da estatal. Decisões monocráticas (de uma única pessoa) são a maior fonte de insegurança jurídica, diz o presidente da consultoria Inter.B, Claudio Frischtak, que classifica a sentença de Lewandowski como ilegal.
No período pré-eleitoral, o Congresso tem aproveitado para retirar salvaguardas criadas para evitar ingerência em entidades públicas. Neste mês, ao apreciar o projeto de lei das agências reguladoras, a Câmara dos Deputados retirou a limitação a indicados políticos e seus parentes em estatais – mudança que havia sido aprovada na Lei das Estatais, em 2016. “É um trem fantasma”, define Tadini, da Abdib. “A cada esquina tomamos um novo susto.”