Impacto das chamadas “pautas-bomba” no Congresso ultrapassa os R$ 100 bilhões, mais do que o dobro do que o governo federal gasta com o custeio básico da máquina pública
Em meio a uma das maiores crises fiscais que o país já enfrentou, o Congresso aprovou nesta semana uma série de projetos que agradam a parlamentares e aliados, mas oneram os cofres da União. São medidas que aumentam os gastos públicos e reduzem a arrecadação ao perdoar dívidas e multas, e conceder benefícios tributários a diversos setores.
O Congresso correu para votar diversos projetos porque entrará em férias na próxima semana. A Câmara dos Deputados e o Senado terão recesso a partir de 18 de julho e voltarão a trabalhar em 1.º de agosto. A força-tarefa para votar projetos que já estavam em tramitação começou no início da semana e seguiu até a madrugada desta quinta-feira (12), quando foi aprovada a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2019.
O problema é que a maioria dos projetos já aprovados ou que estão em debate com chances de aprovação agrava ainda mais a dívida bruta do governo geral, que já está em 77% do Produto Interno Bruto (PIB), o maior percentual da série histórica. Por isso, são chamados de “pautas-bomba”. A dívida bruta do governo é um dos principais indicadores para avaliação de solvência por agências de risco, ou seja, para analisar a capacidade que o governo tem de cumprir seus compromissos.
Caso todo os projetos sejam aprovados e entrem em vigor, a estimativa de impacto fiscal é de mais de R$ 100 bilhões para os próximos anos. Para efeito de comparação, somente para custeio básico da máquina pública, como água, telefone, energia e aluguel de imóveis, o governo gasta cerca de R$ 45 bilhões por ano.
Hoje, mais de 90% dos gastos da União são obrigatórios. Entre os gastos obrigatórios estão folha de pagamento do funcionalismo e da Previdência. Somente o que sobra vai para investimentos, políticas públicas e programas sociais, por exemplo.
Governo refaz as contas para fechar o Orçamento
Enquanto a “pauta-bomba” avança no Congresso, o governo tenta uma compensação, com medidas que aumentam receita e reduzem gastos na tentativa de, pelo menos, fechar as contas de 2019. O ministro da Fazenda, Eduardo Guardia, já fez apelos aos presidentes da Câmara e do Senado para segurar as votações da chamada “farra fiscal”. Até esta quinta-feira (12), não teve muito sucesso na sua empreitada.
A situação é delicada para a equipe econômica. Diante de um governo fragilizado e às vésperas das eleições, o trabalho é praticamente de enxugar gelo: a cada medida que manda para o Congresso, o resultado, depois das modificações dos parlamentares, é mais gastos e renúncias.
A área econômica tem até o final de agosto para fechar o Orçamento do ano que vem e já avisou que vai propor novamente o adiamento do reajuste dos servidores em 2019 e a tributação dos fundos exclusivos para clientes de alta renda. A primeira medida poderia economizar de R$ 6 bilhões (servidores civis) a R$ 11 bilhões (se incluir os militares). Já a tributação dos fundos renderia outros R$ 6 bilhões só para a União.
Confira os principais projetos da pauta-bomba do Congresso e o estágio de tramitação
1) Compensação da União aos Estados pela desoneração do ICSM à exportação
Impacto: R$ 39 bilhões ao ano
Projeto: obriga a União a transferir, todos os anos, R$ 39 bilhões a estados e Distrito Federal como uma compensação pela não incidência de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) sobre as exportações de bens primários semielaborados e operações entre entes da federação que são destinadas à industrialização e comercialização.
Tramitação: aprovado em comissão mista, segue para apreciação nos plenários da Câmara e Senado
2) Benefício para transportadoras e caminhoneiros autônomos
Impacto: R$ 27 bilhões até 2020
Projeto: o texto prevê que as transportadoras possam retirar da base de cálculo de impostos uma parcela dos seus custos operacionais, como pedágio. As empresas e caminhoneiros autônomos que aderirem a um plano de renovação de frota serão isentos de PIS/ Cofins e IPI na compra de caminhões. O valor pago em pedágios pelas empresas ainda poderia ser abatido do Imposto de Renda. Há, ainda, a possibilidade de anistia de multas emitidas por evasão de fiscalização.
Tramitação: aprovado na Câmara, segue para o Senado
3) Refis para dívidas do Funrural
Impacto: R$ 13 bilhões ainda em 2018
Projeto: prevê o parcelamento tributário (Refis) das dívidas do agronegócio com o Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural (Funrural).
Tramitação: o projeto foi aprovado na Câmara e no Senado.
4) Refis do Simples
Impacto: R$ 7,8 bilhões por ano
Projeto: prevê o parcelamento tributário de dívidas (Refis) das pequenas e médias empresas que recolhem impostos pelo Simples Nacional, o regime tributário diferenciado para pequenos negócios que faturam até R$ 4,8 milhões.
Tramitação: o projeto foi aprovado na Câmara e no Senado
5) Revogação do benefício para refrigerantes
Impacto: R$ 1,78 bilhão ao ano
Projeto: o Senado reverteu a medida do governo que reduziu a alíquota de IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) sobre concentrados de refrigerantes de 20% para 4%. Quanto menor a alíquota, menos créditos fiscais para abater outros impostos são gerados pelo setor.
Tramitação: o Senado reverteu a medida, e agora o projeto segue para a Câmara.
6) Manutenção do reajuste salarial a servidores
Impacto: R$ 8 bilhões
Projeto: o relatório da LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) previa que o reajuste dos servidores não fosse concedido no ano que vem. Mas esse ponto foi derrubado no Congresso. Os parlamentares derrubaram trechos que vedavam a aprovação de reajustes a servidores públicos e que obrigavam o próximo governo a cortar 5% das despesas com custeio administrativo no ano que vem.
Tramitação: a vedação ao Reajuste foi derrubada pelo Congresso
7) Reinclusão de empresas no Simples
Impacto: não estimado
Projeto: Senado aprovou por unanimidade um projeto que permite que empresas excluídas do Simples Nacional por dívidas tributárias . Matéria já tinha sido aprovada pela Câmara
Tramitação: aprovada na Câmara e no Senado. Segue para sanção
8) Permissão para venda direta de etanol
Impacto: R$ 2,4 bilhões ao ano
Projeto: suspende parte da Resolução 43/09, da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) para liberar a venda direta de etanol pelos produtores aos postos. Adoção pode gerar perdas tributárias de até R$ 2,4 bilhões ao ano.
Tramitação: aprovada no Senado. Segue para a Câmara
9) Renovação Sudene e Sudam e inclusão Sudeco
Impacto: R$ 9,3 bilhões até 2020
Projeto: prorroga incentivos fiscais para empresas instaladas nas áreas de atuação das superintendências do Desenvolvimento da Amazônia (Sudam) e do Nordeste (Sudene). Ela também concede o mesmo benefício a empresas instaladas na Superintendência de Desenvolvimento do Centro-Oeste (Sudeco).
Tramitação: na Câmara
10) Criação de novos municípios
Impacto: não estimado
Projeto: estabelece regras para criação de municípios no Brasil. Até 300 novos municípios podem vir a ser criados com a medida.
Tramitação: na Câmara.
11) Tesouro deve financiar juros de precatórios de Estados e municípios
Impacto: não calculado
Projeto: quando o Congresso aprovou uma emenda constitucional no final do ano passado, incluiu um artigo que obriga a União a subsidiar o pagamento de precatórios de Estados e municípios.
Tramitação: A emenda foi aprovada pelo Congresso; a equipe econômica avalia como acomodará essa despesa
12) Reajuste para agentes comunitários de saúde
Impacto: não estimado
Projeto: Congresso aprovou o reajuste do piso salarial para agentes comunitários de saúde. Pela proposta, que segue para sanção presidencial, o piso passa de R$ 1.014 para R$ 1.500 até 2021.
Tramitação: o projeto foi aprovado pelo Congresso