Ideia é prever compensações para bancar novos incentivos aprovados pelo Congresso
O Ministério da Fazenda prepara a edição de um decreto para barrar a entrada em vigor de renúncias fiscais até que sejam feitas as compensações de receitas para bancar quaisquer novos incentivos aprovados pelo Congresso Nacional. A área econômica quer evitar o que aconteceu com duas edições do Refis (programas de parcelamento de débitos tributários), implementadas sem a compensação de receitas. Em 2017, o Brasil deixou de arrecadar 354,7 bilhões de reais com renúncias fiscais no ano passado.
A ideia agora é “regulamentar” o polêmico artigo 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), que obriga a apresentação de estimativa do impacto das perdas e de medidas para compensá-las. Pelo artigo, a concessão ou ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária da qual decorra renúncia de receita deverá estar acompanhada de estimativa do impacto orçamentário no ano em que entrar em vigor e nos dois seguintes, atendendo ao disposto na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO).
A compensação tem de ser feita por meio do aumento de receita, seja com elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, criação de tributo ou corte de outras renúncias.
Embora o artigo da LRF seja autoaplicável, a ideia é especificar situações em que a compensação será exigida, ou o benefício ficará prejudicado. O entendimento é que o decreto vai deixar claro o impedimento do governo de conceder a renúncia em casos como os dos Refis para dívidas do Simples e do Funrural. Com o decreto, o governo fica impedido de dar continuidade à adesão dos contribuintes ao parcelamento.
A ampliação do perdão no chamado Refis do Funrural (contribuição previdenciária de produtores rurais individuais) elevou a renúncia fiscal de R$ 7,6 bilhões para R$ 15 bilhões em 15 anos. No Refis do Simples, a estimativa era um perdão de R$ 7,8 bilhões no mesmo prazo.
Os descontos generosos a esses devedores haviam sido vetados pelo presidente Michel Temer (MDB), justamente pela ausência de previsão no Orçamento. Mas o Palácio do Planalto acabou negociando a derrubada desses vetos pelo Congresso como um aceno à base aliada, provocando uma saia-justa para a equipe econômica. Técnicos avaliam que o governo não poderia nem mesmo ter aberto a adesão aos Refis.
O Tribunal de Contas da União já foi avisado de que o decreto deverá ser editado para afastar dúvidas interpretativas. A corte vinha acompanhando a questão porque o Ministério Público junto ao TCU fez uma representação e pediu a suspensão dos programas. O ministro do TCU Vital do Rêgo manteve as adesões, mas emitiu alerta ao governo para o risco de descumprimento da LRF. Ele exigiu informações sobre os riscos dos Refis para as contas públicas.
No TCU, o entendimento é de que, depois do alerta, não há mais espaço para a repetição do que vem ocorrendo, sob pena de punição grave. Ou seja, o governo não poderá implementar nenhuma nova concessão de benefícios aprovada pelo Congresso sem a respectiva compensação. O tema é delicado para o governo, que não quer confronto com o Congresso. A Fazenda não quis comentar o andamento da proposta.
Um relatório do TCU das contas do governo em 2017, aprovadas com ressalvas em junho, revelou que as renúncias fiscais somaram 354,7 bilhões de reais no ano passado. De acordo com o documento, o governo teria melhores condições de sanear as contas públicas concedendo menos incentivos para determinados setores da economia.
O montante equivale a 30% da receita líquida do governo no ano e supera os déficits da Previdência Social e do regime de aposentadorias dos servidores federais, que somaram 268,8 bilhões de reais em 2017. Segundo o TCU, 84% das renúncias têm prazo indeterminado, o que faz a perda de arrecadação ser incorporada às contas do governo.
(com Estadão Conteúdo)