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DESTAQUE: Brasil tem o quinto maior banco de sementes do mundo

O patrimônio genético conta com 127.783 amostras de 1.019 tipos de alimentos, além do DNA de animais adaptados às condições climáticas do país



No fim do ano passado, um casal de médicos de Campinas, São Paulo, procurou no Brasil inteiro sementes do trigo espelta, uma espécie que, até a Idade Média, era bastante consumida na Europa. A busca incessante tinha um motivo importante – os dois pesquisadores estudavam o uso desse tipo de trigo como alternativa de alimentação para as pessoas com intolerância ao glúten, além de apresentar vantagens nutricionais em relação ao trigo comum.


A procura só terminou quando o casal teve acesso ao Banco Genético da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). No local, existem 15 variedades de sementes do trigo espelta. Há, também, 127.783 amostras de 1.019 espécies de alimentos, conservadas na forma de sementes.


O Banco Genético da Embrapa já salvou os índios da tribo Krahô, que vivem no Norte do Tocantins. A comunidade não conseguia cultivar a variedade específica de milho que consumia há muitas gerações. Há duas décadas, vieram, primeiro, os técnicos da Fundação Nacional do Índio (Funai) para verificar a disponibilidade do grão especial. Depois, o cacique esteve pessoalmente na Embrapa, com um grupo da comunidade, para fazer a solicitação inusitada para os padrões indígenas. O líder da tribo Krahô saiu do Banco Genético da Embrapa com um lote contendo 100 sementes do milho.


No ano seguinte, a surpresa. O mesmo grupo voltou à Embrapa, mas, dessa vez, para devolver as sementes que já tinham sido multiplicadas pela comunidade no seu habitat natural, em Tocantins. A entrega foi marcada pelo agradecimento, reverenciamento e até uma certa idolatria aos técnicos da Embrapa – deuses da multiplicação. “Se algum dia nós perdermos as nossas sementes, sabemos que poderemos voltar aqui novamente para buscar”, sentenciou o cacique, entre lágrimas.

Os relatos acima retratam os objetivos de um banco genético. Ele serve para garantir diversidade de um certo tipo de semente, conservando, assim, as diferentes características nutricionais, sabor, resistência a doenças, capacidade de adaptação a diferentes climas, solos e regiões. Serve, também, para a conservação de espécies relacionadas à alimentação e à agricultura, foco do banco da Embrapa. “Nosso trabalho vai além da preservação das espécies. Nos preocupamos com a diversidade genética que existe dentro de uma espécie. Por exemplo, mesmo no caso do milho, uma espécie largamente cultivada, há risco de perda de diversidade”, explica o engenheiro agrônomo Juliano Gomes Pádua, curador do Banco Genético da Embrapa.

NÃO ESQUECIDAS


Apesar da natureza do trabalho realizado no banco genético da Embrapa ser a conservação de alimentos de grande importância na economia, as demais espécies, menos populares, não são esquecidas. Variedades consideradas de pouca expressão econômica, as denominadas espécies negligenciadas, como jiló, maxixe e quiabo, entre outras, também têm espaço no local.


Fora do circuito alimentação/agricultura, o Banco de Genética da Embrapa se dá ao luxo de conservar bromélias que foram coletadas há mais de 30 anos, no local onde está localizado, hoje, o lago da Hidrelétrica de Itaipu. Passadas três décadas, os testes realizados constataram que as sementes estão com a totalidade percentual de germinação, ou seja, não houve perdas para a germinação das bromélias.

PARCERIA INTERNACIONAL


Quinto maior banco genético de sementes do mundo, o banco da Embrapa reúne uma espécie de cópia do manancial genético dos 150 bancos de conservação mantidos pela empresa em todo o país. No acervo, estão, inclusive, 31 espécies ameaçadas de extinção. A Colbase, como é denominado o Banco Genético da Embrapa, em referência à coleção de base, recebe, também, material enviado por instituições parceiras do Brasil e do exterior. As instalações, em Brasília, compreendem quatro câmaras frias para conservação de sementes a longo prazo, câmaras para conservação de plantas in vitro e salas de criotanques para conservar recursos genéticos vegetais, animais e microbianos. Periodicamente, são realizados testes para avaliar a qualidade fisiológica e sanitária do material genético conservado.


Os recursos genéticos vegetais são conservados no Banco Genético de três formas – sementes ficam em câmaras a temperaturas de 20 graus abaixo de zero. Já as espécies cujas sementes não resistem a baixas temperaturas ou que não são cultivadas por meio de sementes, a conservação é feita em tubos de ensaios, ou em condições criogênicas, a uma temperatura de -196°C. Ainda este ano será implantada a Coleção Criogênica Vegetal. “A população não conhece a ciência que existe por trás de um prato de comida. São doenças e pragas que conseguimos debelar, variedades que foram adaptadas às nossas condições climáticas, melhoramento genético. Todo um trabalho foi feito com o alimento até chegar ao agricultor e depois para a população”, explica Juliano Gomes Pádua.


Contribuição para o agronegócio


Os microrganismos também têm lugar no banco genético. Eles podem ser usados em programas de melhoramento genético de plantas para seleção de variedades resistentes – e de interesse para a agroindústria e produção animal. A conservação desse tipo de material genético deve ser feita dentro do maior rigor, em conformidade com os padrões internacionais, garantindo, assim, a acessibilidade, a longo prazo, para estudos de aplicação no agronegócio e demais setores produtivos.


As culturas microbianas são importantes para as pesquisas sobre temas diversos, como tratamento de doenças, produção de vacinas para aplicação em seres humanos e animais, geração de energia renovável e redução do impacto ambiental. No setor agrícola, avançam as pesquisas para soluções, a partir de microrganismos, capazes de reduzir a liberação de produtos químicos no ambiente e para aumentar o rendimento das culturas agrícolas, como inseticidas, herbicidas, fungicidas, biorremediadores e promotores de crescimento de plantas.

São mantidas 5.023 amostras microbianas nas coleções da Embrapa. As coleções incluem espécies com potencial para o controle biológico de pragas, doenças e insetos vetores de doenças, entre outros. A criopreservação, que é um método de congelamento, é usada para a conservação de sêmen, embriões, DNA e tecidos de animais. Botijões de nitrogênio líquido a temperaturas que vão de 80°C negativos a 196 graus abaixo de zero são usados para a conservação desses materiais genéticos animais. No banco genético se encontram amostras de raças consideradas localmente adaptadas de bovinos, suínos, caprinos, ovinos, bubalinos, asininos e equinos.

RAÇAS COMERCIAIS


Em breve, a Embrapa passará a oferecer espaço em seu banco genético para o armazenamento de sêmen, com ênfase em linhagens formadoras das raças comerciais que vêm sendo subutilizadas. Esse material genético será conservado a longo prazo, mediante a assinatura de acordo de depósito padrão, que garante a propriedade do depositante e a não manipulação pela Embrapa.


Dados da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), o braço da ONU que lidera os esforços internacionais de erradicação da fome e da insegurança alimentar, atualmente existem 1.750 bancos de sementes instalados em mais de 100 países. Na Noruega está localizado o Banco Global de Svalbard, o maior do mundo, com a nobre missão de conservar, a longo prazo, uma cópia de segurança de cada espécie vegetal do planeta. O Banco Genético da Embrapa já enviou amostras de arroz, feijão e milho para o banco norueguês. A importância do banco global pode ser percebida nas situações de destruição, guerras ou catástrofes de um país, como ocorreu com a Síria, que teve o seu banco de sementes destruído. O país, no entanto, conseguiu recuperar boa parte do material genético porque tinha amostras no banco da Noruega.



TESTES NO ESPAÇO

A Embrapa forneceu as amostras da árvore gonçalo-alves (Astronium fraxinifolium) que foram usadas em um experimento na Estação Espacial Internacional. Em março de 2006, as sementes foram levadas ao espaço pelo astronauta brasileiro Marcos Pontes (foto), durante a Missão Centenário, que reunia oito experimentos científicos brasileiros para a realização em ambiente de microgravidade. A árvore, que é conhecida no país também pelos nomes de aroeira-do-campo, aratanha, chibatã e batão, pode atingir até 12 metros de altura. No experimento no espaço suas sementes germinaram mais rapidamente do que na terra.



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