Experimento com camundongos fez animal sadio ‘contrair’ a doença
O processo de desenvolvimento do Alzheimer ainda não é completamente conhecido pela ciência e um novo estudo, publicado nesta terça-feira no periódico “Molecular Psychiatry”, sugere que um tipo de proteína produzida em todo o corpo é capaz de ultrapassar a barreira protetora do cérebro, provocando a doença. Além disso, o experimento realizado com camundongos demonstrou que a condição talvez possa ser transmitida pela transfusão de sangue.
A barreira entre o sangue e o cérebro enfraquece com a idade — explicou Weihong Song, professor da Universidade da Colúmbia Britânica, em Vancouver, no Canadá, e coautor do estudo. — Isso deve permitir que mais beta amiloides se infiltrem no cérebro, complementando as que são produzidas pelo próprio cérebro e acelerando a deterioração.
A beta amiloide é a principal constituinte das placas de amiloide, que provocam a deterioração das atividades cerebrais em pacientes com demência. A proteína é produzida naturalmente pelo cérebro, mas também em outras partes do organismo, como nas plaquetas, nos vasos sanguíneos e nos músculos.
No experimento, Song e seu colega Yan-Jiang Wang, da Terceira Universidade Médica Militar da China, em Chongqing, conectaram um camundongo normal, que não desenvolve o Alzheimer naturalmente, a outro que carrega um gene humano mutante que produz altos níveis de beta amiloide, fazendo com que os dois animais compartilhassem o mesmo sangue.
Segundo Song, após um ano, o camundongo normal “contraiu” a doença de Alzheimer pelo sangue carregado com a proteína do animal mutante. A beta amiloide entrou na corrente sanguínea do roedor sadio e foi capaz de ultrapassar as barreiras que protegem o cérebro e formar placas de amiloide, provocando a doença.
Entre os sinais do Alzheimer, o camundongo “contaminado” apresentou degeneração das células neurais, inflamação e pequenas hemorragias. E a capacidade de transmitir sinais elétricos envolvidos no aprendizado e na memória também foi afetada.
— A doença de Alzheimer é claramente uma doença do cérebro, mas nós precisamos prestar atenção a todo o corpo para compreender de onde ela vem e como pará-la — disse Song, sugerindo que drogas podem ser criadas para destruir a beta amiloide antes que ela consiga alcançar o cérebro.
Para Tara Spires-Jones, da Universidade de Edimburgo, o estudo tem seu valor pode demonstrar que a proteína beta amiloide pode se espalhar por todo o corpo, mas ressalta que “não existem dados que indicam que as pessoas devem se preocupar em pegar Alzheimer por transfusão de sangue”.
— Não existe evidência de que o Alzheimer seja uma doença transmissível — comentou a pesquisadora, não envolvida no estudo.
Essa é a mesma posição de James Pickett, diretor de pesquisas da Sociedade do Alzheimer do Reino Unido. Estudos que acompanharam pessoas que receberam transfusões de doadores que desenvolveram Alzheimer não encontraram evidências de aumento no risco da doença.
— Ver a transferência da beta amiloide do sangue de um camundongo para o cérebro numa situação extremamente artificial num laboratório não nos diz que isso acontece com pessoas na vida real — disse Pickett. — As pessoas não devem ser alarmadas.