Laços de amizade contêm revoada dos economistas tucanos até convenção
Apreço pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, apoio ao projeto do senador Tasso Jereissati (Ceará) de refundar o PSDB e a percepção de que o partido ainda pode recuperar a identidade e fazer diferença na eleição do ano que vem. Esse são os três pilares que sustentam no partido uma parcela relevante dos economistas ditos liberais e que dão identidade ao PSDB há uns 20 anos.
Muitos deles, porém, podem seguir o exemplo de Gustavo Franco, tucano de carteirinha que se desfiliou e migrou para o Partido Novo.
Mesmo sendo pequeno e politicamente inexpressivo, o Novo cresce atraindo a simpatia de executivos de bancos e gestores de fundos de investimento. O PSDB, na toada oposta, mesmo sendo grande e expressivo, provoca desalento na comunidade econômico-financeira.
A convenção nacional da sigla, marcada para o dia 8 de dezembro, definirá o plano de voo de cada um.
Nesse encontro, encerra-se oficialmente o mandato do senador Aécio Neves. Será escolhido o novo presidente do partido –e por conseguinte o tom do discurso e o arcabouço institucional do PSDB para a campanha de 2018.
O governador de Goiás, Marconi Perillo, vem emergindo como alternativa de consenso entre os políticos.
Mas uma fatia ampla da ala econômica quer mesmo é Tasso, avaliado como sendo mais fiel aos princípios liberais próprios do PSDB desde a fundação. "Se Tasso perder na convenção, eu saio do PSDB e muita gente sai também", disse Elena Landau em entrevista à Folha.
Caso se concretize, não será uma revoada qualquer. Entre filiados e sem vínculos oficiais, mas com estreita e ostensiva convivência, a ala econômica do PSDB é de alta plumagem. Reúne os profissionais que lançaram as bases para a estabilização da moeda e das contas públicas do Brasil a partir da segunda metade dos anos 1990.
Ainda que em separado tenham peculiaridades pessoais e políticas, um ideário os une. Defendem a economia de mercado, o Estado mínimo, a privatização, a modernização na gestão e na prestação do serviço público.
Foram eles que deram sustentação intelectual para projetos que o PSDB defendeu ou implantou ao ocupar cargos público na União, nos Estados e nos municípios.
Além de Elena, que conduziu parte do programa de desestatização no governo de FHC, lá estão pais do Plano Real como Edmar Bacha e Pérsio Arida; o ex-ministro da Fazenda Pedro Malan; o ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga, que estruturou o sistema de metas de inflação em vigor até hoje. Junto com Gustavo Franco, eles são os liberais da PUC-Rio.
Há também um ramo acadêmico, em que transitam economistas como Samuel Pessôa, Armando Castelar e Luiz Roberto Azevedo Cunha.
A vertente paulista também está aborrecida, mas em silêncio. Estão recolhidos no ninho tucano economistas como José Roberto Mendonça de Barros, ex-secretário de Política Econômica da Fazenda, e seu irmão, Luiz Carlos Mendonça de Barros, ex-presidente do BNDES.
Rio e São Paulo, na verdade, ilustram um pouco o racha interno do partido.
Alguns cariocas "fichados", como se chamam os que são filiados ao PSDB, quase debandaram em agosto: Elena, Bacha e Cunha. Suspenderam a retirada a pedido de Tasso.
"Vou esperar a convenção", diz Bacha, que se assume "muito insatisfeito", mas prefere dar voto de confiança à proposta de reformulação da legenda. Cunha é mais incisivo: "À essa altura, somos do partido do Tasso. Não terá sentido ficar se ele sair".
Luiz Carlos Mendonça de Barros propõe o inverso. "Não tenho idade para sair do PSDB e também não vejo alternativa no Novo: é um movimento característico da zona Sul do Rio, um tanto festivo, mas que não vai se viabilizar até a próxima eleição, um período decisivo para o Brasil. A hora agora é ficar e fortalecer o PSDB", diz.
O estranhamento dos economistas com o partido não é de agora. Começou em 2015, quando a bancada da sigla votou contra o fator previdenciário. Seria um baque nas contas públicas, queixaram-se os economistas. Mas a posição foi defendida por parlamentares que aderiram ao "quanto pior para o governo de Dilma Rousseff, melhor".
Feito o impeachment, o desconforto ressurgiu quando pipocaram relatos de corrupção envolvendo integrantes do governo de Michel Temer. As denúncias contra o presidente e Aécio causaram espanto e vergonha.
A partir dali, a permanência do PSDB na base do governo se tornou tão indigesta que os incomodados começaram a pensar em sair.
Muitos acreditam que o próximo da fila será Armínio Fraga. Ele não é filiado, mas tem voz no PSDB. Foi indicado como futuro ministro da Fazenda de Aécio na campanha presidencial. Assim como Gustavo Franco, aproximou-se do Partido Novo. Segundo amigos, comemorou a migração do colega como um "golaço" do Novo.
Procurado, não quis fazer comentários. Alegou que já havia expressado publicamente sua posição. Em entrevista à Folha, em agosto, lamentou não ter visto "o lado mais extremo" de Aécio. "Uma tristeza", definiu.
Um dos cernes da insatisfação geral é justamente a insistência de Aécio em se agarrar ao PSDB. O consenso é que ele deveria se afastar para se acertar com a Justiça.
Há grande expectativa em relação ao julgamento nesta semana pelo Supremo Tribunal Federal. A corte deve bater martelo se pode definir o destino de parlamentares acusados de corrupção. O resultado pode tirar Aécio do jogo e abrir espaço para um novo plano de voo.
"Vai ser uma tragédia, uma perda para a sociedade, se um partido como o PSDB for irremediavelmente arrastado por investigações policiais como a Lava Jato",diz Samuel Pessôa, que também espera a convenção.