Bilhetes enviados por Luiz Fernando da Costa, o Fernandinho Beira-Mar, apreendidos pela Polícia Federal, revelam que, de dentro do presídio de Porto Velho, em Rondônia — onde estava preso até maio deste ano —, o chefão deu ordens para comparsas, determinou a partilha do faturamento de sua quadrilha, revelou gastos com advogados e visitas de parentes e detalhou como seu bando lava o dinheiro do tráfico. A partir dos recados, os investigadores descobriram que umas das formas usadas por Beira-Mar para lavar dinheiro é o investimento em obras no Parque das Missões, favela dominada pelo bando em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, município onde o traficante nasceu.
Num dos bilhetes, encontrado num e-mail usado por Luan Medeiros da Costa, filho do traficante, os agentes descobriram gastos da quadrilha de R$ 26.500 com materiais de construção e R$ 3.500 com o pagamento de um pedreiro. No recado, os valores são acompanhados da inscrição “obras na MS”, abreviação de Parque das Missões. Segundo uma decisão da Justiça Federal de Rondônia, os repasses “coincidem com o período do início das obras no Parque das Missões, as quais são custeadas pela organização criminosa”. Durante as investigações, a PF descobriu que Beira-Mar se associou com empresários para lavar dinheiro a partir do “fornecimento de serviços e produtos dentro das comunidades que comanda”. Os empresários cedem seus nomes e suas empresas em troca de uma parte do lucro.
Em outro bilhete, o traficante afirma que tem despesas mensais de R$ 150 mil — R$ 20 mil só com passagens e hospedagens em visitas de parentes. “Hoje, minha despesa mensal gira em torno de R$ 150 mil e esse dinheiro da caixinha mal vai dar para minhas despesas de visita”, escreveu o bandido. De junho de 2016 a maio deste ano, Beira-Mar recebeu 83 visitas. Em outro bilhete, o chefão determina a divisão dos lucros com a venda de cada carga de cocaína.
Transferência após ação
As transcrições dos bilhetes, obtidas pelo EXTRA, fazem parte do processo contra Beira-Mar originado pela operação Epístolas, que prendeu oito parentes e dois advogados do traficante, em maio. Após a operação, a Justiça determinou a transferência do traficante de Rondônia para Mossoró, no Rio Grande do Norte.
Na última quarta-feira, o ministro do STF e ex-ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, afirmou que chefões do tráfico não conseguem chefiar suas facções de dentro de presídios federais.
— Dentro dos presídios esses chefões de facção continuam liderando o crime. E dentro de presídio federal eles não fazem isso. Não vão fazer e vão continuar lá enquanto a Justiça entender ser necessário para garantir a segurança da sociedade — disse Moraes.
A afirmação, entretanto, contradiz a conclusão da investigação. Segundo a PF, Beira-Mar enviou bilhetes a seus comparsas de dentro do presídio federal “nos anos de 2016 e 2017”.
Os bilhetes também serviram como base para que o juiz corregedor da penitenciária de Porto Velho, Walisson Gonçalves Cunha, mantivesse Beira-Mar preso numa penitenciária federal fora do Rio por mais um ano, até 2018.
Segundo as investigações, Fernandinho Beira-Mar, chefão da maior facção do Rio, repassava bilhetes para seu vizinho de cela, que entregava para sua mulher durante a visita íntima. A mulher, por sua vez, os digitalizava e enviava para parentes e advogados.