A síndrome afeta 32% da população e consiste no esgotamento mental e físico decorrente das atividades realizadas no trabalho. Saiba como identificar
A gestora de comunidade Bianca Camargo se considerava uma workaholic. Achava que seu vício em trabalho, cobrança excessiva e perfeccionismo eram parte de sua personalidade. No início de 2015, notou que essas características estavam a afetando — começou a ter crises de enxaqueca, irritabilidade e ficar muito sensível. “Comecei a questionar quem eu era. Todos me conheciam como uma viciada em trabalho, mas notei que isso não era da minha personalidade, eu estava doente”, conta.
Bianca descobriu que era um caso entre os 32% de brasileiros que sofrem com a Síndrome de Burnout, segundo dados da pesquisa mais recente realizada pelo ISMA-BR (International Stress Management Association no Brasil). A síndrome é considerada ocupacional, pois decorre da rotina de trabalho do indivíduo. De uma maneira simplificada, consiste no esgotamento mental — e físico – decorrente das atividades realizadas no ofício profissional.
Segundo a presidente e coordenadora de pesquisa da ISMA-BR Ana Maria Rossi, a síndrome reúne três sintomas muito característicos: exaustão física e mental, a pessoa sente uma sensação constante de cansaço, de que ultrapassou seus limites e não consegue mais lidar com as situações; ceticismo, o indivíduo se torna insensível ao que está acontecendo ao seu redor e aos colegas; e ineficácia, quando o funcionário se sente incompetente, consegue identificar sua baixa produtividade, mas não tem condições de melhorar. “O Burnout é um passo antes do suicídio, é o fundo do poço”, enfatiza Rossi.
“Eu não tinha vida social, ficava 12 horas no trabalho e parecia que nunca estava bom. Eu me cobrava demais, achava que precisava ficar mais tempo e fui me isolando de tudo. Meus amigos começaram a reclamar da minha ausência. Me vi em um ciclo vicioso” — Bianca Camargo.
Bianca chegou a passar oito meses sem ver seus amigos, mas, dentre todos os problemas, o mais difícil foi notar que parte de suas características “naturais”, na verdade, eram uma doença. “Eu achava que as minhas características que não eram boas. Eu pensava: ‘eu não sou uma boa amiga. Não faço bem o meu trabalho. Eu não tenho tempo de descanso'”, relata a gestora.
Depois de descobrir a síndrome, Bianca fez alguns ajustes. Mudanças foram fundamentais para recuperar a saúde. Foto: arquivo pessoal.
Entre as razões mais comuns para o desenvolvimento da síndrome, estão o excesso de carga de trabalho, cobrança por resultados mesmo com falta de recursos físicos e financeiros para o empregado executar suas tarefas, atividades que obrigam o funcionário a violar seus princípios éticos e falta de gratificação e reconhecimento. “Em geral, os profissionais estão trabalhando além das suas capacidades. O Burnout é cumulativo, não se pega de hoje para amanhã. Acontece ao longo do tempo”, reforça Rossi.
“O Burnout é o tipo de exaustão que não passa com o tempo, nem com férias” — Ana Maria Rossi
Segundo Rossi, os profissionais mais afetados são aqueles que precisam estar atentos o tempo todo, como nas áreas de segurança e medicina. A tensão pela violência no sistema público de transporte, repetição e falta de controle sobre o trabalho também coloca os motoristas de ônibus entre as primeiras posições do ranking, além dos atendentes de telemarketing, bancários e executivos. “Pessoas que trabalham fora de sua área de atuação, em geral, entram para a lista pelos níveis de frustração”, ressalta.
Diagnóstico e tratamento
De acordo com a psicóloga e conselheira do Conselho Regional de Psicologia do Paraná Caroline Walger, nem todo estresse no trabalho pode ser enquadrado na enfermidade, mas é preciso estar atento à frequência dos acontecimentos. “Um determinado nível de estresse é normal, mas quando isso começa a acontecer todos os dias e leva a uma situação em que a pessoa não consegue se desligar do trabalho, começa a se caracterizar como a síndrome”, afirma.
A síndrome causa sintomas como choro excessivo, alterações de humor e sono, nervosismo, problemas gástricos (gastrite, úlcera, pressão alta) taquicardia e, em níveis altos, a pessoa não consegue ir para o trabalho. O abuso de substâncias na busca de relaxamento também é comum.
“Abrir mão de ser workaholic não me fez ser menos produtiva e nem prejudicou meu trabalho. Doente não ia a lugar algum. Fiz pequenos ajustes que mudaram tudo”, conta Bianca.
A partir da percepção dos sintomas, é indicada a busca por auxílio médico e psicológico. “Existem técnicas simples de relaxamento que podem ser úteis, como fazer pequenos intervalos durante o horário de trabalho e exercícios de respiração”, indica Walger.
Manter-se competitivo no mercado de trabalho e cuidar do currículo é outro aspecto essencial, de acordo com Rossi. Com isso, a autoestima do profissional aumenta e ele tem mais confiança caso precise procurar um novo emprego. Manter uma rede de apoio com familiares, amigos e colegas também ajuda no tratamento. Para Bianca, essa foi a peça chave. “Não é bom tirar a sustentação do trabalho logo de cara, mas tem que construir novos pilares para se apoiar, pilares mais saudáveis, como relacionamentos e amizades“.