Os dados de estupro no Brasil são claros: mais da metade das vítimas são vulneráveis. Crianças são violentadas por conhecidos ou familiares
Quando a maioria das pessoas pensa em estupro, talvez a cena a seguir é a mais comum que vem à cabeça: uma garota de roupas curtas e apertadas vagando sozinha pelas ruas escuras da cidade. Ao cruzar um beco, é surpreendida por um homem encapuzado. Ele, um completo desconhecido, decide violar essa bela moça em um lugar público, acobertado e escondido no meio da noite.
Essa descrição não poderia estar mais distante da realidade. A 12ª edição do Dossiê Mulher, lançada em agosto de 2017, reporta as violências ocorridas no Rio de Janeiro. Apesar de estudar apenas um estado, ele revela tendências que ocorrem no país inteiro. Os dados de estupro são assustadores: 55% das mulheres estupradas têm menos de 14 anos, o que é caracterizado como estupro de vulnerável, e em quase 40% dos casos o agressor é alguém que a vítima conhece.
O informe da Anistia Internacional de 2016/17 apontou que o Brasil é um dos piores lugares da América Latina para se nascer menina, com a violência de gênero sendo um dos principais motivos para a afirmação. O relatório “Estupro no Brasil: uma radiografia segundo os dados da Saúde“, feito pelo Ipea, comprova que os dados de estupro no Rio de Janeiro são parecidos com os do resto do país. 88,5% das vítimas brasileiras de estupro são mulheres, 50,7% têm até 13 anos e, dentre essas crianças, quase um terço é violentada por membros da família, como padrastos, pais e irmãos.
O informe da Anistia Internacional de 2016/17 apontou que o Brasil é um dos piores lugares da América Latina para se nascer menina, com a violência de gênero sendo um dos principais motivos para a afirmação. O relatório “Estupro no Brasil: uma radiografia segundo os dados da Saúde“, feito pelo Ipea, comprova que os dados de estupro no Rio de Janeiro são parecidos com os do resto do país. 88,5% das vítimas brasileiras de estupro são mulheres, 50,7% têm até 13 anos e, dentre essas crianças, quase um terço é violentada por membros da família, como padrastos, pais e irmãos.
A doutora em Direitos Humanos e professora de Direito Penal Maíra Zapater explica a situação com um exemplo. “Se um menino ou menina de 11 anos mantém relação sexual com alguém maior de idade e essa pessoa alegar que a criança ‘quis transar’, isso é irrelevante para a lei”. Maíra informa que o crime, em caso de vulneráveis, pode ser denunciado por uma terceira pessoa que saiba do ocorrido.
Além disso, o código penal prevê a notificação compulsória. Isso quer dizer que quando a mulher for atendida em serviços de saúde, sejam eles públicos ou privados, e for notada violência, os atendentes dela devem denunciar.
Subnotificação “É importante destacar que crianças e adolescentes são mais vulneráveis, já que muitas vezes a relação de confiança e dependência com os agressores dificulta o entendimento do ato sexual não desejado como uma violência”, afirma o antropólogo social e doutorando em ciências sociais Julian Simões.
O especialista acredita que, apesar da vulnerabilidade, talvez as crianças não sejam as que mais sofrem estupros. Julian explica que a subnotificação de violência sexual é um fenômeno mundial e que alguns fatores, como não acreditar no sistema de justiça para lidar com a agressão, vergonha, culpa e laços com o agressor, distanciam as vítimas da denúncia.
O antropólogo aponta que alguns sintomas comuns de crianças e adolescentes que sofreram violência sexual são alterações no sono, mudanças bruscas de humor, estresse ao enfrentarem situações cotidianas que anteriormente não eram problemáticas e aparecimento de “medos”, como dormir no escuro e ficar sozinho.
Para Julian, a única forma de precaução eficaz é a conversa. “Ao falarmos do direito ao próprio corpo e dos demais temas que valorizem o respeito, criamos estratégias de proteção que ajudariam a diminuir a ocorrência dos casos”, afirma.