Um relatório da PF afirma que integrantes da PGR tinham "ciência de que Miller estava atuando de forma indireta nas negociações da colaboração premiada"
A Polícia Federal encontrou no celular de Wesley Batista, presidente-executivo e sócio da JBS, uma série de mensagens que reforçam a atuação do ex-procurador Marcello Miller a favor da empresa quando ainda atuava no Ministério Público. Um relatório da PF afirma que integrantes da PGR (Procuradoria-Geral da República) tinham "ciência de que Miller estava atuando de forma indireta nas negociações da colaboração premiada". O ex-procurador fazia parte de um grupo de Whatsapp com diretores e delatores da JBS. Ele só se manifestou no grupo, porém, no dia 4 de abril, seu último dia de trabalho no Ministério Público no Rio. Outras mensagens, porém, mostram que ele já orientava o acordo de delação desde março. Um dos diálogos revela que ele foi convidado a ir para a reunião, em 28 de março, em que os empresários assinaram o termo de confidencialidade com a PGR se comprometendo a dar início às tratativas da delação. "Amanhã ele tem expediente no atual emprego dele e não pode não", disse Francisco de Assis e Silva, executivo e advogado da JBS, também delator. Em outra mensagem, porém, ele afirmou "estou tentando levar o Marcello amanhã". Não fica claro se o ex-procurador esteve ou não presente na PGR no dia 28 de março. Segundo a PF, as mensagens evidenciam "a participação de Marcello Miller como peça fundamental no êxito do acordo". Para a polícia, a JBS cooptou um agente público para lograr êxito em uma delação que lhes garantiu imunidade. "O que impressiona é o fato de que a cooptação de Miller ocorre no momento em que supostamente os investigados se apresentavam às autoridades públicas com uma proposta baseada fundamental em um duplo alicerce: arrependimento, diga-se dispostos a não mais delinquir, e propensos a colaborar de forma efetiva". A polícia sustenta que houve no mínimo a promessa de vantagem ilícita, apontando o crime de corrupção passiva e ativa. A PF ainda conclui que o advogado Francisco de Assis e Silva mentiu em depoimentos quando disse que Miller não havia participado do acordo de delação. Outro lado Por meio de nota, a PGR afirma que "não procedem as informações" e que não tem conhecimento do relatório da PF. O órgão diz que "trata-se de conversas de terceiros fazendo suposições sobre a atuação de integrantes do Grupo de Trabalho que auxiliam o procurador-geral da República nos processos da Lava Jato perante o Supremo Tribunal Federal". A PGR alega que os fatos veiculados mostram "que foi frustrada a tentativa dos advogados dos colaboradores de misturar indevidamente negociações de colaboração premiada e leniência. A PGR, de fato, negociou as colaborações (matéria penal), firmadas em maio, e a Procuradoria da República no DF conduziu as tratativas de leniência (matéria cível), cuja conclusão ocorreu em junho deste ano". Linha do tempo A PF coloca em seu relatório uma linha do tempo da participação de Miller. 1) 17 de março: Ricardo Saud afirma que estaria "jeitando" a situação empresarial com Marcello Miller 2) 27 de março: Wesley pede a presença de Miller na reunião que ocorreu no dia 28 de março na PGR para assinatura de termo de confidencialidade 3) 31 de março: ocorre provável reunião entre Miller e os advogados Francisco de Assis e Silva e Fernanda Tórtima 4) 3 de abril: Marcello trata com o DOJ (Departamento de Justiça dos EUA) por telefone o acordo de leniência 5) 4 de abril: último dia de Marcello como procurador, dando orientação para a colaboração e a leniência em um grupo de Whatsapp com diretor e delatores da JBS 6) 5 de abril: data em que é exonerado do Ministério Público, Miller se reúne com Wesley no aeroporto do Galeão antes de embarcar para os Estados Unidos para tratar de leniência com o DOJ 7) 6 de abril: Miller participa de reunião no DOJ defendendo interesses da JBS na leniência