Fatos narrados pelo doleiro poderão ficar em sigilo inicialmente; no Palácio do Planalto, ministros tentam minimizar impacto da nova acusação.
A Procuradoria Geral da República (PGR) aguarda somente a homologação da delação do doleiro Lúcio Funaro, pelo ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), para apresentar uma nova denúncia contra o presidente Michel Temer.
A expectativa é que a homologação ocorra na próxima semana, antes ou depois do feriado de 7 de setembro, na quinta-feira. A acusação, por suposta prática de obstrução de Justiça e organização criminosa, já está praticamente pronta para ser enviada em seguida.
No Palácio do Planalto, auxiliares próximos de Temer trabalham com a possibilidade de o procurador-geral Rodrigo Janot apresentar a segunda denúncia terça ou quarta. A ideia é que o presidente esteja em Brasília para contestar as suspeitas que devem ser levantadas (leia mais abaixo).
A nova acusação deverá conter trechos do que foi narrado e entregue pelo doleiro, que, segundo as investigações, operava propina para o ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e um grupo de políticos do PMDB que incluiria Temer entre seus membros.
A rigor, a apresentação da denúncia, encaminhada primeiramente ao STF, não depende da homologação da delação, que valida o acordo de colaboração e permite a abertura de novas investigações.
Mas, com o uso das informações de Funaro, é remota a chance de a PGR enviar a denúncia sem a segurança dada pela homologação.
Uma grande dúvida que ainda existe é quando será retirado o sigilo da delação. Pela lei, o segredo cai somente numa fase mais adiante, quando a denúncia é aceita pela Justiça, ato que leva à abertura de ação penal e torna o acusado réu.
Na Lava Jato, no entanto, isso costuma ocorrer bem antes, quando a PGR avalia que já não há necessidade de manter o sigilo, mesmo antes da apresentação de denúncia.
A questão, porém, divide ministros do STF e poderá ser levada por Edson Fachin, relator da Lava Jato na Corte, para apreciação do plenário, composto por 11 ministros. Isso deve ocorrer na própria delação de Funaro, já que envolve o presidente da República.
O caso de Temer também tem peculiaridades porque, diferentemente de outras pessoas ou autoridades, é a Câmara dos Deputados que primeiro analisa a denúncia para depois autorizar (ou não) o STF a examiná-la.
Assim, se for mantido o sigilo da delação, é possível que inicialmente a denúncia contra Temer também fique em segredo, pelo menos enquanto não for remetida pelo STF para análise da Câmara, onde precisa receber autorização de ao menos 342 deputados para poder ser examinada pelos 11 ministros do STF.
Temer
Para estar presente no momento da denúncia, Temer manifestou a interlocutores a chance de antecipar o retorno da viagem à China.
Ele passou por Pequim, onde se encontrou com o presidente da China, Xi Jinping, e ainda tem a previsão de participar da cúpula do Brics, bloco de países emergentes composto por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. Realizado na cidade de Xiamen, o encontro se encerra na terça (5).
O governo já ensaia o discurso para tentar esfriar o impacto político da nova acusação. Segundo apurou o G1, fala-se no Planalto que a acusação feita por Janot terá apenas “ilações”.
Nesta sexta-feira (1º), o Planalto divulgou nota com críticas à delação de Lúcio Funaro. Para auxiliares do presidente, a delação não teria elementos capazes de indicar o envolvimento direto de Temer em algum crime.
A ordem também é manter discurso de otimismo, além de repetir a versão de que Janot “persegue” Temer e quer “parar o Brasil”. Na última segunda-feira (28), o chefe Casa Civil, Eliseu Padilha, afirmou que o governo vai “enfrentar” a denúncia.
"Se vier uma nova denúncia, por certo nós estaremos preparados para politicamente enfrentá-la, no que diz respeito ao campo político, e juridicamente enfrentá-la no campo jurídico", disse o ministro.
A área política do governo já recebeu alertas de parlamentares da base aliada sobre o clima adverso na Câmara para barrar a segunda denúncia.
Deputados que votaram a favor de Temer em agosto têm receio de encarar um novo desgaste em seus redutos eleitorais. Eles também cobram a fatura da votação anterior, por meio de cargos na máquina federal.
Uma dos pontos que preocupa o Planalto é a insatisfação de parlamentares do bloco partidário chamado de “centrão”, que cobram parte do espaço ocupado pelo PSDB no governo.
Os tucanos ocupam quatro ministérios (Cidades, Relações Exteriores, Secretaria de Governo e Direitos Humanos) e se dividiram na votação da primeira denúncia.