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POLÊMICA: PEN, partido no qual Bolsonaro quer se candidatar à presidência, é contra prisão em segund

Deputado Jair Bolsonaro pretende se candidatar pela legenda que quer soltar corruptos



O Partido Ecológico Nacional (PEN) ajuizou no Supremo Tribunal Federal ação pedindo que a corte declare a constitucionalidade do artigo 283 do Código de Processo Penal, que condiciona o início do cumprimento da pena ao trânsito em julgado de ação penal.


Na prática, a ação declaratória de constitucionalidade busca que o STF reveja o entendimento firmado no julgamento do Habeas Corpus 126.292, quando permitiu que a pena pode ser executada depois da confirmação da condenação por uma decisão de segundo grau — ou seja, antes do trânsito em julgado.



A decisão do STF que está valendo desde fevereiro de 2016, alterou jurisprudência que vigoravam desde 2009. Ao permitir a prisão sem o trânsito em julgado, a maioria dos integrantes do tribunal seguiu o voto do falecido ministro Teori Zavascki para dizer que o princípio da presunção de inocência não impede que as condenações sejam executadas depois de uma decisão de segunda instância. O entendimento foi o de que os recursos ao Superior Tribunal de Justiça e ao STF não têm efeito suspensivo e não discutem fatos nem provas, apenas matéria de direito.


Na ação protocolada em maio de 2016, o PEN critica a decisão do Supremo alegando que a corte não poderia ter tomado aquela decisão sem analisar antes a constitucionalidade do artigo 283 do CPP, inserido na legislação em 2011. Segundo o partido, faltou também no julgamento o amplo debate necessário ao caso, diante de sua relevância. “Na verdade, a alteração da orientação jurisprudencial surpreendeu a todos aqueles que contribuem para o funcionamento do sistema de Justiça criminal”, diz a inicial.


Ao defender a constitucionalidade do artigo do CPP, o partido afirma que a Constituição Federal de 1988 é produto de um processo constituinte aberto e participativo, passível de diversas interpretações. Ainda segundo o partido, compete ao legislador atuar desde que observe os limites materiais e formais estabelecidos pelo texto constitucional, não cabendo ao Poder Judiciário substituir a decisão legislativa legítima por outra que lhe pareça mais oportuna, conveniente ou adequada.


Para o PEN, a redação atual do artigo 283 do CPP, dada pela Lei 12.403/2011, trata-se de uma interpretação constitucionalmente possível dada pelo legislador. “O texto veicula parâmetro para a conformação do princípio da presunção de inocência, especificamente no que toca à pena de prisão, que se situa, indubitavelmente, dentro da moldura normativa estabelecida pelo artigo 5º, LVII, da Constituição Federal. Ainda que se sustente que não se trata da melhor interpretação, não é possível negar que se cuida de interpretação possível, válida e razoável do texto constitucional”, diz o partido.


Além de dispor contra decisão legislativa expressa, o PEN afirma que o atual entendimento do Supremo Tribunal Federal — que permite o início do cumprimento da pena antes do trânsito em julgado — cria uma nova modalidade de prisão não prevista em lei. O partido explica na inicial que a legislação brasileira, em particular o artigo 283 do CPP, só prevê a prisão cautelar (preventiva ou temporária) e a prisão definitiva.



“A postura proativa adotada pelo Judiciário ao formalizar decisões de perfil aditivo encontra, nas cláusulas constitucionais de reserva de poder, um limite salutar. A observância dos âmbitos de competência reservada de cada um dos poderes é fundamental para a manutenção da higidez normativa do princípio da separação de poderes”, complementa. A petição inicial é assinada pelos advogados Antônio Carlos de Almeida Castro, Cláudio Pereira de Souza Neto, Ademar Borges de Sousa Filho e Beatriz Veríssimo de Sena.


Estado de coisas inconstitucional

Caso o Supremo Tribunal Federal não declare plenamente constitucional o artigo 283 do CPP, o Partido Ecológico Nacional pede que o dispositivo seja declarado ainda constitucional enquanto perdurar o chamado estado de coisas inconstitucional no sistema carcerário brasileiro.


O partido lembra que o próprio STF, ao julgar Medida Cautelar na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 347 (ADPF 347), proclamou a existência de estado de coisas inconstitucional no sistema carcerário brasileiro uma vez que se constitui em ambiente de contínua violação de direitos fundamentais dos detentos, realidade causada pela reiterada inércia do poder público, agravada pela cultura do encarceramento existente no país.


Para o PEN, ainda não há dados específicos sobre o impacto no sistema prisional brasileiro da nova orientação jurisprudencial adotada pelo STF a propósito da execução provisória da pena. “Mas o certo é que o relevante incremento do número de presos não definitivos — principalmente considerado o elevado número de recursos especiais criminais a serem examinados pelo Superior Tribunal de Justiça — contraria os fundamentos determinantes do julgamento da medida cautelar na ADPF 347”, diz.


Conforme o partido, a gravidade do estado de coisas inconstitucional em que se encontra o sistema prisional brasileiro torna a afirmação da constitucionalidade do artigo 283 do CPP ainda mais necessária. “Não é coerente com a decisão proferida pelo STF no acórdão da Medida Cautelar da ADPF 347 uma alteração jurisprudencial que agrave ainda mais a superlotação dos estabelecimentos prisionais brasileiros”, argumenta.


“Assim, caso não se acolha o pedido de declaração de constitucionalidade do artigo 283 do CPP, requer-se que a norma seja declarada ainda constitucionalenquanto não cesse o estado de coisas inconstitucional que caracteriza o sistema carcerário brasileiro, de modo que, até lá, seja vedado o cumprimento antecipado da pena. Quando menos, a execução provisória deveria ser obstada enquanto não ocorresse o julgamento definitivo da ADPF 347 e se cumpram as providências fixadas pelo STF”.


O partido pede ainda que, se o STF decidir por continuar entender ser possível o início do cumprimento de pena antes do trânsito em julgado, sejam aplicadas as medidas alternativas prevista no CPP enquanto perdurar o atual estado de coisas inconstitucional. Para o partido, diante da incerteza sobre a inocência do réu, devem prevalecer as interpretações que preservem sua liberdade o tanto quanto possível.


“Tendo em vista que a prisão cautelar dá-se antes da condenação do réu, o legislador, em observância ao princípio da presunção de inocência, estabeleceu um conjunto de medidas que, embora eficazes, evitam o seu aprisionamento prematuro. Novamente, percebe-se que, na reforma processual penal realizada pela Lei 12.403/2011, o Legislador procurou criar mecanismos — a exemplo também do artigo 283 do CPP — que transformam o encarceramento em medida última e extrema, aplicável somente quando não resta dúvida acerca da condenação — trânsito em julgado —, ou cautelarmente, quando a liberdade do réu implica risco real para a sociedade ou para o processo criminal”, justifica.

Aplicação retroativa

Na ação, o PEN pede ainda que, caso o Supremo mantenha o atual entendimento sobre a prisão antes do trânsito em julgado, que seja aplicado o princípio da irretroatividade de norma penal mais severa, prevista na Constituição Federal. Conforma a petição inicial, o Supremo Tribunal Federal tem afastado a retroatividade da alteração jurisprudencial mesmo quando não está em jogo a liberdade de locomoção.


“Se mesmo em outras áreas do Direito recomenda-se a incidência apenas prospectiva da mudança jurisprudencial, no campo do Direito Penal e Processual Penal, que se relaciona a um bem jurídico provido da máxima fundamentalidade — a liberdade pessoal —, não pode ter lugar a retroação dos parâmetros jurisprudenciais mais gravosos”, diz trecho da inicial.


Segundo o partido, a aplicação de regra processual que tenha por consequência o cerceamento da liberdade do réu deve ser estrita, afetando apenas as hipóteses posteriores ao novo regramento. “A conclusão a que se chega, a partir da análise sistemática dos precedentes, é que o STF tem garantido a irretroatividade de normas processuais penais mais gravosas — e, de outro lado, a retroatividade de normas processuais favoráveis — sempre que identifica uma relação entre a norma processual e o direito material subjacente: estando em jogo algum aspecto da liberdade de locomoção do acusado, deve-se adotar a máxima da irretroatividade de alterações normativas gravosas ao acusado.”

Clique aqui para ler a petição inicial.


Bolsonaro presidente

Às vésperas de se filiar ao Partido Ecológico Nacional (PEN), ligado a comunidades evangélicas, o deputado federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ) já disparou contra a nova sigla. O motivo é o PEN tentar derrubar no Supremo Tribunal Federal (STF) a decisão da Corte que permitiu a prisão em segunda instância. Bolsonaro é favorável à decisão do STF e disse que não sabia do posicionamento do partido. Afirmou ainda que vai pedir que a ação seja retirada. Já o presidente da sigla, Adilson Barroso, defende o processo e diz que só vai desistir se for “convencido” pelo novo filiado.


— Quando há um casamento, alguma coisa você vai perder e outra coisa ela vai perder. Para mim essa questão é crucial. Fica complicado ser de um partido que arranjou uma forma dos bandidos se livrarem — disse o deputado ao GLOBO, que manifestou surpresa ao saber que o PEN é patrocinador da ação que pode mudar o entendimento do Supremo:

— Não tinha conhecimento disso. Não mudo um milímetro do que disse. Estamos discutindo no partido se terei a presidência (do próprio partido). Se eu tiver, retiro a ação, mas vou conversar com o Adilson (Barroso) de qualquer forma para retirar — afirmou o parlamentar.


Antes de informado pelo GLOBO sobre a posição do PEN, Bolsonaro disse ser a favor da prisão logo em segunda instância:

— Acho que a segunda instância é mais do que suficiente. Se coubesse a mim, eu manteria a perda da liberdade em condenação na segunda instância.

Por sua vez, Adilson Barroso, presidente do PEN, faz uma defesa enfática de que a condenação só poderia acontecer ao final do trânsito em julgado.


— Eu não sou jurista, mas concordei com o doutor Kakay e com o que a equipe dele me mostrou, que até um terço das condenações são revistas. Eu mantenho isso aí. Se a Constituição não vale nada, então fica um país vulnerável, que não cumpre as leis — afirmou o presidente do partido.

Após saber do desconforto de Bolsonaro com ação, o presidente da legenda destacou que há outra ação, feita depois em nome da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Afirmou que, portanto, uma eventual retirada do processo pelo PEN não seria um empecilho, se for convencido pelo deputado de que este é o melhor caminho.


— Estou aqui para ajudar o Bolsonaro a ser presidente da República. Se ele me convencer que realmente não é bom e que não está na Constituição, sou um cara que sei recuar daquilo que possa afetar o entendimento da população. Se eu, na conversa, chegar ao entendimento podemos ver, mas eu sei que ele é homem e com os argumentos também posso persuadi-lo. Mas se eu foi convencido por ele, aceito claramente retirar. Mas é preciso me convencer de que me equivoquei porque eu acho que temos que defender a nossa Constituição — disse Adilson.


Kakay diz não acreditar que a ação seja retirada. Ele ressalta que a proposta da OAB é mais restrita e não contém, por exemplo, a possibilidade de se fixar no STJ a execução da pena. O advogado reconhece que não teria conseguido apresentar a ação se Bolsonaro já estivesse na legenda.


— Talvez se Bolsonaro estivesse lá não deixaria entrar, mas não vejo porque retirar agora — disse o advogado.


Com informações do Consultor Jurídico e O Globo

Foto da capa – Framephoto/31-03-2017 / Chello/Agência O Globo

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