Rodrigo Janot informou ao STF que vai instaurar procedimento interno de investigação. Caso revelado em 2009 envolve suspeita de venda de passagens da cota parlamentar para agências de viagem.
procurador-geral da República, Rodrigo Janot, informou ao Supremo Tribunal Federal que vai instaurar uma "notícia de fato" (procedimento interno de investigação preliminar) para apurar se há indícios do envolvimento de 199 políticos com foro privilegiado no STF com o caso conhecido como "farra das passagens aéreas".
São deputados federais, senadores, ministros de Estado e ministros do Tribunal de Contas da União (TCU) que já foram parlamentares (leia o documento da Procuradoria Geral da República que relaciona os políticos).
O caso envolve suspeitas de que, entre 2005 e 2009, deputados negociavam, entre 2005 e 2009, com agências de viagens passagens da cota parlamentar. Esses deputados estariam usando a cota para viagens de parentes e amigos.
O escândalo foi revelado em março de 2009 pelo site Congresso em Foco. Depois disso, o então presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), que havia assumido o cargo em fevereiro, anunciou mudanças no uso das passagens, restringindo viagens internacionais e limitando o benefício a parlamentares e assessores.
Um inquérito específico em relação a alguns deputados, aberto em 2005, foi arquivado pelo Supremo em 2016 e indícios relativos a pessoas sem foro privilegiado foram enviados ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1).
No mesmo procedimento, a Procuradoria da República na 1ª Região denunciou no fim do ano passado 443 ex-deputados pelo crime de peculato (desvio de dinheiro público) e remeteu ao Supremo uma lista com 212 nomes de pessoas suspeitas de envolvimento que têm foro privilegiado.
Em março deste ano, o ministro Luiz Fux, relator do procedimento no STF, enviou então a lista para que o procurador-geral decidisse se queria ou não investigar os políticos.
Em documento datado de 24 de julho último e protocolado no Supremo na última terça-feira (25), Janot informou a Fux que, dos 212 nomes, 13 não têm foro no STF e pediu que as suspeitas sobre eles sejam encaminhadas ao TRF-1 e à Justiça Federal em Brasília.
Na avaliação do procurador, em relação aos demais 199 com foro no STF, ainda não há indícios suficientes de atos ilegais dos políticos nos autos e não é possível apurar as condutas de todos em um mesmo procedimento, mostrando-se, segundo ele, "razoável uma apuração inicial no âmbito do Ministério Público".
"Apesar do registro pelas companhias aéreas de emissão de passagens em favor de terceiros, com utilização de verba das cotas de transporte dos parlamentares acima listados, não há nos autos informações suficientes sobre a efetiva participação e ilicitude da conduta dos investigados. Ademais, o grande número de investigados nesses autos, inviabiliza a apuração pormenorizada da conduta de cada um dos envolvidos, mostrando-se razoável uma apuração inicial no âmbito do Ministério Público Federal, a fim de esclarecer a ilicitude da conduta de utilização das verbas fora da autorização normativa e a efetiva participação dos parlamentares", diz o procurador.
Segundo Janot, após o procedimento preliminar, ele vai analisar se pede ou não abertura formal de inquéritos.
"Considerando o grande número de envolvidos e que o desmembramento do feito, para individualizar as condutas, causaria enorme transtorno ao Supremo Tribunal Federal, o procurador-Geral da República requer o arquivamento da presente Petição, informando essa Corte, desde já, que será instaurada de Notícia de Fato no âmbito do Ministério Público Federal, para melhor esclarecimento dos fatos quanto à materialidade e autoria, para, se for o caso, em seguida, requer-se a instauração de inquérito", afirmou Janot.
O pedido para arquivar a lista com os 199 políticos com foro no Supremo e remeter 13 nomes a outras instâncias será analisado pelo ministro Fux.
A Procuradoria Geral da República não tem praz, após a instalação da apuração interna, para decidir se pede ou não abertura de investigação formal ao STF.
O caso
A chamada "farra das passagens" tornou-se pública em 2009. De acordo com as investigações, deputados utilizavam a verba da chamada cota parlamentar para emitirem passagens aéreas para viagens de lazer.
Segundo o procurador Elton Ghersel, que apresentou denúncia ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região contra parlamentares e ex-parlamentares no ano passado, os deputados também utilizavam a verba pública para comprar passagens para familiares e amigos.
Em outros casos, segundo o procurador, os parlamentares chegaram a vender milhas referentes à cota parlamentar para agências de viagens, que as revendiam para outros clientes.
À época em que o caso foi revelado, os deputados tinham direito a uma cota mensal de seis passagens aéreas, que deveriam ser destinadas a viagens aos estados de origem ou a viagens oficiais. Se o valor não fosse integralmente utilizado, os deputados podiam usar o excedente para outros fins.
Em razão das revelações, a Câmara alterou a forma como as cotas são repassadas aos parlamentares.
Atualmente, a Casa transfere aos deputados os valores de reembolso de todos os gastos oficiais, sem discriminação entre os serviços. Os gastos com passagens de cada deputado ficam disponíveis na página da Câmara.