Dados do Cadastro Único do governo federal mostram que, entre junho deste ano e o mesmo mês do ano passado, houve um acréscimo de 20 mil famílias que são beneficiadas por programas como o Bolsa Família e dormem em vias públicas. Especialistas apontam a crise econômica como o principal motivo da alta.
Em um ano, o cadastro único para programas sociais do governo federal registrou um aumento de 35% no número de famílias beneficiadas por essas políticas vivendo nas ruas do Brasil. Foi um aumento de cerca de 20 mil famílias entre junho de 2016 e o mesmo mês desse ano, chegando a 76.883. Somente entre maio e junho de 2017, houve um aumento de mais de mil famílias. Os dados são do Ministério de Desenvolvimento Social, responsável pela lista.
O pedreiro Gilberto da Silva mora nas ruas do Rio há quatro meses. Beneficiário do programa Bolsa Família, conta que não tem conseguido voltar para o mercado de trabalho. "O que me fez vir para a rua foi o mercado de trabalho. Foi por causa dessa crise aí, do desemprego. Mas isso [morar na rua] não é viver, é vegetar. Não tem coisa melhor do que você viver do seu ordenado, do seu trabalho", explica o calceteiro.
A economista Maria Beatriz David, professora da Uerj, explica que o momento econômico atravessado pelo país pode, sim, ter sido um dos motivos que levaram ao crescimento do número de cadastrados em medidas para assistência morando em vias públicas. Ou seja, a pessoa perde o emprego na crise, não consegue arcar com o aluguel e acaba nas ruas, mesmo ganhando Bolsa Família. O Brasil tem mais 13 milhões de desempregados atualmente.
E a pesquisadora afirma que a população com menor grau de qualificação é a que fica mais vulnerável nessas situações: "São vários os motivos, mas os principais são a reflação econômica, as dificuldades que enfrenta o país e o desemprego. Quem perde mais com recessão e tudo isso são os mais vulneráveis: a mão de obra menos qualificada, que é a primeira a perder o emprego, e os jovens com menos experiência".
Esse é o caso de Luzineia dos Santos, que, com dificuldades financeiras, passou a viver em vias públicas na Zona Sul carioca. Para piorar a situação, ainda convive com problemas cardíacos. "A gente procura um emprego, mas é muito difícil. Porque, hoje em dia, para a pessoa ter um trabalho, primeiro tem que ter estudo. Até para varrer a rua tem que ter curso. E tem uma coisa: eu sou analfabeta. Aí fica mais difícil arrumar", lamenta.
A conjuntura tem chamado atenção de associações voltadas para os direitos humanos, como o projeto Ruas, uma ONG que leva serviços para essa população. Uma das colaboradoras, Larissa Montel, lembra que a discriminação é outra barreira que dificulta essa reinserção social. "Eu reforçaria a questão do preconceito por estar nessa situação. Muitas vezes, o preconceito com a forma como e se porta fecha a oportunidade para uma vaga", explica.
No total, existem mais de 27 milhões de famílias inscritas no cadastro único para programas sociais do governo.