Indicação articulada pelo corregedor nacional de Justiça, João Otávio de Noronha, reforça a imagem de nepotismo na Corte
O Senado aprovou nesta terça-feira, por 59 votos favoráveis, 5 contrários e uma abstenção, o nome do juiz de direito Luciano Nunes Maia Freire, do Tribunal de Justiça do Ceará, para integrar o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).
Ele é sobrinho do ministro do STJ Napoleão Nunes Maia Filho.
Ele foi escolhido pelo STJ em votação secreta realizada no dia 10 de maio deste ano, quando o juiz obteve 18 votos entre os 31 ministros que participaram da sessão do Pleno. Napoleão não votou.
O resultado representa uma dupla vitória para o ministro João Otávio de Noronha, corregedor nacional de Justiça, que articulou o lobby em torno do candidato ao CNMP e apoiara a recondução dos conselheiros Fernando Mattos e Daldice Maria Santana de Almeida ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Foi justamente a discussão acalorada em torno do parentesco que levou o tribunal a suspender a votação, no final de abril. Havia o receio de que a indicação viesse a expor o tribunal durante a sabatina no Senado, quando a indicação poderia ser vinculada à imagem de nepotismo no STJ.
Alguns ministros haviam levado à sessão uma resolução do Legislativo que impede a indicação de parentes aos Conselhos.
Com o apoio da maioria do pleno, a ministra Laurita Vaz adiou a escolha e pediu a cada candidato que informasse “se é cônjuge ou parente em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive, de membro ou servidor do STJ ou do Poder Judiciário”.
Dos 51 magistrados que disputaram a indicação, oito responderam que possuíam parentes no Judiciário.
Único candidato com parente no STJ, Luciano Nunes Maia Freire registrou no formulário, além do tio, o nome de sua mulher, a juíza de direito Roberta Ponte Marques Maia, do Tribunal de Justiça do Ceará.
Luciano Nunes Maia Freire é titular da 1ª Vara Privativa de Crimes de Tráfico de Drogas da Comarca de Fortaleza. É juiz desde 2009, membro do Núcleo Permanente de Juízes Criminais e Grupo de Descongestionamento do Interior. Atuou na Justiça Eleitoral e participa de projetos voltados para a infância e juventude e de mutirões da vara de audiência de custódia na capital.
É bacharel em Direito pela Universidade de Fortaleza, com Pós-graduação lato sensu em Direito Processual pela Universidade da Amazônia.
Nepotismo e política de grupos
A questão de parentesco não foi impedimento para a votação. Entre os outros cinco magistrados mais votados, três também declararam ter parentes juízes e servidores no Judiciário.
Durante a primeira sessão de votação, a presidente Laurita Vaz afirmou que se sentia desconfortável, porque Noronha convidara dias antes um grupo de ministros para um happy hour em casa, iniciativa que foi considerada um lobby para indicar nomes de candidatos ao CNMP e ao CNJ.
A presidente disse, na ocasião, que tem feito uma administração ouvindo a todos e não gostaria que a política de grupos voltasse a prevalecer no tribunal.
Embora defenda a ideia de o tribunal não indicar parentes, Laurita Vaz manteve-se neutra. Obtidas as declarações de parentesco, criou uma comissão de ministros para examinar a questão e oferecer parecer ao Pleno se havia irregularidade na indicação de parente.
A comissão se dividiu. Os ministros Felix Fischer e Humberto Martins consideraram que não havia irregularidade. A ministra Nancy Andrighi entendeu que havia.
A indicação de Luciano Nunes Maia Freire para o CNMP reafirma a influência no tribunal do advogado Cesar Asfor Rocha. São citados como próximos ao ex-presidente do STJ, além de Napoleão, os ministros Humberto Martins, Mauro Campbell e Raul Araújo.
Aparentemente, os 18 votos dados ao juiz cearense seriam uma espécie de recado para o público externo, afirmando que a resolução antinepotismo é do Legislativo e não se aplica ao Judiciário.
Ministro foi citado em delação da JBS
O delator Francisco Silva contou a procuradores ter conversado com Willer Tomaz, advogado preso na operação Patmos, sobre a suposta interferência do ministro Napoleão Nunes do STJ em favor da empresa. Maia Filho nega.
É graças à PEC da Bengala que ele está até hoje na corte. A proposta virou lei em 2015, mudando a idade de aposentadoria compulsória dos ministros de 70 para 75 anos, meses antes de Maia Filho, que tem 71, ter que se aposentar. Com 24,4 mil processos, é hoje o dono do maior acervo do STJ.”