Confúcio Moura assinou pacto com Organização dos Estados Americanos e não cumpriu; PGR e Singeperon pediram intervenção
Em agosto de 2011, na cidade de Bogotá (Colômbia), representantes do governo do Estado de Rondônia, ministérios públicos Federal e Estadual, União, Ministérios das Relações Exteriores, Justiça, membros do judiciário rondoniense e outras autoridades assinaram o chamado “Pacto para melhoria do sistemas prisional do Estado de Rondônia e levantamento das medidas provisórias outorgadas pela Corte Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos”.
A assinatura do documento impediu na época, que Rondônia sofresse uma intervenção federal e a União uma punição pela OEA, em função do episódio que ficou conhecido como “chacina do Urso Branco“, quando 27 presos foram mortos em uma rebelião ocorrida em 2002. Em 2008 o então procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, pediu intervenção federal em Rondônia após novas denúncias de tortura e mortes em série de detentos no presídio Urso Branco, em Porto Velho. Já se passaram 15 anos desde a chacina e o sistema prisional só piorou.
Agentes penitenciários acusam direção de presídio de “acordo” com presos
Com 13 páginas, o pacto foi delineado em cinco eixos de atuação: Eixo I – Infra-Estrutura: Ampliação de vagas e melhorias na estrutura física dos presídios e cadeias públicas; Eixo II – Dimensionamento e Qualificação do Quadro de Pessoal: Medidas para contratação e formação de agentes e servidores administrativos, incluindo ações de qualificação do atendimento ao apenado; Eixo III – Apuração dos Fatos e Responsabilização: Determinação de prazos para conclusão dos inquéritos e dos julgamentos dos envolvidos no caso Urso Branco, implantação de Centro de Apoio à Execução Penal, no âmbito do Ministério Público, dentre outras ações com o escopo de apurar, responsabilizar e evitar novos episódios atentatórios aos direitos humanos; Eixo IV – Aperfeiçoamento dos serviços, mobilização e inclusão social: Ações relacionadas à celeridade para resposta às demandas da população carcerária e de seus familiares, bem como incremento das medidas de ressocialização; e Eixo V – Medidas de Combate à cultura de violência: Ações concretas para a criação e consolidação de mecanismos de combate e prevenção à violência, aos maus tratos e à tortura no sistema prisional.
Um diagnóstico prévio já apontava as dificuldades e deficiências do sistema e apontava soluções. Os pontos mais importantes eram o aumento do efetivo de agentes nos presídios; a valorização e qualificação desses profissionais e investimentos em infraestrutura.
Passados 6 anos, o Estado de Rondônia não cumpriu nada do que foi acordado e em função disso, o Sindicato dos Agentes Penitenciários de Rondônia – Singeperon protocolou na última terça-feira no Supremo Tribunal Federal com um pedido de intervenção federal urgente, alegando que o “pacto de melhorias” firmado por autoridades estaduais – de todos os Poderes e órgão fiscalizador (Rondônia) – e federais perante a Corte Interamericana continua sendo descumprindo. E essa foi a segunda vez que a entidade ingressou com o pedido. Em 2013 o então ministro do STF Joaquim Barbosa deu um prazo de 24 horas para que o Estado explicasse o teor das denúncias apresentadas no processo de Intervenção Federal no Estado de Rondônia (I.F. n° 5.129), especialmente em relação ao decreto estadual n° 17.823 de 08/05/2013 que determinou a intervenção militar nas unidades prisionais rondonienses, que havia sido feito em 2008 pela PGR.
Advogado Gabriel Tomasete protocolou pedido no Supremo Tribunal Federal na última terça-feira
Reclama mas não resolve
No pedido, os advogados Gabriel Tomasete, Raul Fonseca, Elton Assis, Vinicius de Assis, Ane Carolina Santos e Johnny Clímaco, representando o Singeperon, mostraram que o governador Confúcio Moura vem sistematicamente ignorando o pacto, chegando inclusive a criticar sua própria gestão, como fez em postagem no seu blog pessoal onde apontou (sem nenhum pudor, diga-se de passagem), que “era muita incompetência dos ordenadores de despesa (?)” o fato da cozinha industrial instalada no presídio Urso Branco, ainda não estar em funcionamento (e não funciona até hoje!).
Agora em 2017, Confúcio deixou de se culpar e passou a responsabilizar o Supremo Tribunal Federal e em postagem declarou, “quero fazer um comentário sobre a recente decisão do Supremo Tribunal Federal, sobre penas financeiras aos Estados que não tratarem dignamente aos seus presos. É um drama entre a realidade dos presídios brasileiros, atulhados, superlotados, indignos de verdade, medievais. Salvo raras exceções. E a coisa foi rolando assim e foi ficando assim, até que o Supremo resolveu dar esta catracada repentina, bem aqui, no queixo, um cruzado de direita, como no UFC. (…)
Se o Estado pode ser punido, então, penso aqui, que o preso é do Estado. Assim pensando, breve apresentarei à Assembléia Legislativa, uma proposta que crie um protocolo de ações do Estado, no quesito penitenciário.
1. Preso provisório – deve ser provisório mesmo. Vou pegar a experiência do Paraná e as ferramentas existentes no Conselho Nacional de Justiça mês que vem. Este, nesta condição tem dia de entrar e dia de sair.
2. Capacidade de cada cadeia – Se a cadeia tiver lotada, para entrar novo preso, tem que sair outro”.
Governo está enviando agentes penitenciários em treino para o Urso Branco
Essa postagem foi feita em 27 de março desse ano, e até agora o quadro só piorou. Outra promessa não cumprida, feita pelo Chefe da Casa Civil Emerson Castro diz respeito ao Plano de Cargos, Carreiras e Salários dos agentes penitenciários, que deveria ter sido enviado para a Assembléia Legislativa em dezembro do ano passado e até hoje não foi, “e olha que ainda ano passado, ele (Emerson) já sabia que o plano tinha passado por todas as análises técnicas e jurídicas, não tendo mais o que ser discutido”, explicou o advogado Gabriel Tomasete, que desde 2011 vem atuando junto ao sindicato e recentemente passou a integrar o escritório Fonseca & Assis, Advogados Associados que atua no direito sindical há mais de 30 anos em Rondônia.
Presídio Urso Branco continua em péssimas condições, reflexo da falta de compromisso do governo e de políticas eficientes
Caso Urso Branco
Em 2008, o então procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, pediu intervenção federal em Rondônia após novas denúncias de tortura e mortes em série de detentos no presídio Urso Branco, em Porto Velho. “Nos últimos oito anos contabilizaram-se mais de cem mortes e dezenas de lesões corporais [contra presos], fruto de motins, rebeliões entre presos e torturas eventualmente perpetradas por agentes penitenciários”, disse o chefe do Ministério Público na época. O caso, porém, nunca foi julgado pelo STF.
Em 2002, uma rebelião de detentos terminou com 27 mortes em Urso Branco. Foi o pior massacre em um presídio desde o Carandiru, em 1992. O episódio rendeu ao Brasil um processo na Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA, que ainda monitora o local. Na época, a rebelião ocorreu após confronto de facções criminosas rivais. Detentos foram decapitados e tiveram os corpos mutilados e esquartejados.
Intervenção federal
Apesar das graves denúncias e do descaso do governo do Estado em cumprir as determinações do acordo, dificilmente o Estado sofrerá imediatamente uma intervenção federal. O motivo é que o mecanismo para forçar a ação federal em questões internas do Estado é complexo e, em boa parte dos casos, requer autorização do Supremo Tribunal Federal ou anuência do Congresso Nacional. Além disso, a intervenção federal só pode ser autorizada em casos específicos, como quando há ameaça à ordem pública ou é urgente a reorganização das finanças do Estado.
Caso o STF autorize a intervenção, cabe ao presidente Michel Temer editar um decreto determinando a medida, assim como apontar o prazo e as condições da ação federal. Em casos específicos, é necessário que o Congresso analise o decreto em um prazo de 24 horas.
Condenação na OEA
O Brasil já acumula várias condenações pela OEA, como nos casos da Guerrilha do Araguaia, chacinas na favela Nova Brasília, no Morro do Alemão (essa mais recente, de maio desse ano). Normalmente após a condenação, casos são reabertos, leis são alteradas ou criadas. O não cumprimento das sentenças pelo Estado (União ou estados) abre uma crise diplomática com os países que são signatários da OEA, entre eles Estados Unidos e Canadá.
Compromissos do Estado