Relator da Lava-Jato no STF considerou os indícios levantados pelo procurador-geral consistentes
No pedido de abertura de inquérito contra o presidente Michel Temer, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, acusa o mandatário número um do país de envolvimento com pelo menos três crimes: corrupção passiva, obstrução de Justiça e organização criminosa. O ministro Edson Fachin, relator da Operação Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), considerou os indícios levantados pelo procurador-geral consistentes e autorizou a abertura de investigação contra Temer.
"Os elementos de prova revelam também que alguns políticos continuam a utilizar a estrutura partidária e o cargo para cometerem crimes em prejuízo do Estado e da sociedade. Com o estabelecimento de tarefas definidas, o núcleo político promove interações diversas com agentes econômicos, com o objetivo de obter vantagens ilícitas, por meio da prática de crimes, sobretudo com corrupção. Há, pois, também o indicativo da prática do delito organização criminosa previsto na lei 12.850/2013", afirma Janot.
O procurador sustenta a acusação no conteúdo de uma conversa gravada entre Temer e o empresário Joesley Batista, um dos donos da JBS. No diálogo, ocorrido na calada da noite de 7 de março deste ano, no Palácio do Jaburu, residência oficial do presidente, Temer indica o deputado Rodrigo Loures (PMDB-PR) para, em futuras conversas, negociar cargos e decisões estratégicas do governo federal. As fraudes renderiam propina de R$ 480 milhões ao longo de 20 anos.
Procurada para falar das acusações, a secretaria de Imprensa da Presidência divulgou uma nota. "No diálogo com Joesley Batista, o presidente Michel Temer diz que nada fez pelo ex-deputado Eduardo Cunha. Isso prova que o presidente não obstruiu a Justiça. Michel Temer não recebeu valores, a não ser os permitidos pela Lei Eleitoral e declarados ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Portanto, não tem envolvimento em nenhum tipo de crime", diz a nota.
Numa ação controlada pedida por Janot, a Polícia Federal fotografou e filmou cenas do encontro em que um emissário de Batista paga a primeira parcela do suborno, R$ 500 mil, a Loures. Na conversa, o empresário descreve crimes que vinham cometendo para obstruir investigações criminais. Relata, inclusive, o pagamento de propina ao ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e ao doleiro Lúcio Funaro, ambos presos, para que os dois permaneçam calados e não façam delação premiada. Ao final do relato do empresário, presidente da República "tem que manter isso, viu".
No pedido, o procurador-geral descreve a forma sorrateira como Batista chega ao Palácio do Jaburu, depois do expediente e direto da portaria para a garagem. Janot também destaca também a intimidade entre o presidente e o empresário, naquele momento alvo de pelo menos cinco grandes operações de combate à corrupção. Para Janot, os supostos crimes teriam ligação direta com o cargo de presidente. Pela lei, um presidente da República não pode ser investigado por atos estranhos ao mandato.
"Como se depreende do relato e das circunstâncias fáticas de tempo, modo e lugar descritas na petição de instauração, estão diretamente relacionadas ao exercício da função. Nesse sentido, importante registrar que um dos delitos em tese cometidos é o de corrupção passiva, o qual, como é sabido, pressupõe justamente o exercício de cargo, emprego ou função por parte do agente (art. 327 do Código Penal)", argumenta o procurador-geral.
TEMER X AÉCIO: SACO DE MALDADES
No mesmo pedido, Janot fala sobre a trama entre Temer e o agora afastado senador Aécio Neves (PSDB-MG) para aprovar a lei de abuso de autoridade, uma anistia geral para políticos acusados de caixa dois e, como se não bastasse, trocar delegados da Polícia Federal para esvaziar os inquéritos já abertos contra parlamentares e ministros acusados de corrupção. A acusação tem como base uma gravação em que Aécio descreve a Bastista diálogos anteriores com Temer e com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) para acabar com a "merda" do projeto das 10 medidas de combate à corrupção do Ministério Público.
"Verifica-se que Aécio Neves, em articulação, dentro outros, com o presidente Michel Temer, tem buscado impedir que as investigações da Lava-Jato avancem, seja por meio de medidas legislativas, seja por meio do controle de indicação de delegados de polícia que conduzirão inquéritos", afirma. Para Janot, na articulação de Temer e Aécio "vislumbra-se a possível prática do crime de obstrução à Justiça previsto do & paragrafo 1 do art 2º da Lei 12.850/2013."
O pedido de abertura de inquérito foi feito a partir da delação premiada dos donos do grupo JBS. Eles revelaram que Temer deu aval para a propina paga ao ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) – que, em troca, não revelaria nada em delação.
Pela Constituição, o presidente da República não pode ser responsabilizado por atos cometidos antes do exercício do mandato. Como os fatos delatados teriam ocorrido depois de Temer ter assumido a presidência da República, não haveria impedimento legal para o início das investigações.
FACHIN NEGA PRISÃO DE AÉCIO
Em decisão nesta quinta-feira, Fachin negou pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR) para prender o senador Aécio Neves (PSDB-MG). Ao contrário da expectativa que se criou nesta quinta-feira, o caso não deverá ser levado ao plenário do tribunal.
Na mesma decisão, o ministro afastou o parlamentar de suas funções, mas o manteve no cargo. Ou seja, o tucano poderá frequentar o Congresso Nacional, mas não está autorizado a votar, por exemplo.