Planalto negocia mudanças na legislação tributária, como unificar o ICMS e dividir PIS e Cofins com estados. Comida e remédios terão impostos zerados. O combate às fraudes será aprimorado
Entra e sai governo e a reforma tributária é tratada como brasa de fogueira: ninguém quer sustentar o assunto por muito tempo. As chances de se queimar com setores importantes da economia são grandes. Mas, para uma gestão calejada pelos açoites que tem recebido por encaminhar temas indigestos ao Congresso, como as mudanças nas regras da Previdência e das relações trabalhistas, nenhum assunto é proibido. Mesmo sob forte pressão dos Estados, receosos de perderem fatias no bolo dos impostos, o presidente Michel Temer vem desenhando com a Câmara um esboço das mudanças sobre regras que perduram há até 30 anos. A formulação do rol de sugestões está em uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), numa comissão especial desde 2015, relatada pelo deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR). Empresários e cidadãos estão insatisfeitos com a atual carga tributária, de 32,9% do PIB, mas, segundo Hauly, esse peso não mudará com a reforma. Apenas será melhor distribuído entre União, Estados e Municípios.
ATAQUE À BUROCRACIA O economista Bernard Appy defende a criação do IVA (Crédito:Ana Paula Paiva/Valor)
Imposto único Em março, Temer disse que encaminharia a mensagem para o Congresso com as alterações, mas desistiu. Segundo seus interlocutores ouvidos por ISTOÉ, a ideia é se debruçar sobre a PEC que já existe. O Planalto criou uma coordenação da Reforma Tributária, com interlocução com a Câmara. “O aproveitamento do projeto de Hauly é, por enquanto, uma possibilidade”, destaca o assessor da Presidência Gastão Alves de Toledo, doutor em direito pela PUC de São Paulo e que foi designado por Temer para ser coordenador da reforma. “Há vários pontos que devem ser aprimorados. Como, por exemplo, a questão dos impostos seletivos.”
A intenção de instituir o Imposto Seletivo Monofásico é para compensar a perda que a União terá com a divisão de contribuições, que hoje são recolhidas apenas para o seu caixa, como o PIS e a Cofins. Pela proposta da reforma, as contribuições também serão divididas entre Estados e Municípios. Os dois tributos serão incorporados juntamente com outros oito, que levarão o nome de Imposto sobre Valor Agregado (IVA). União, governos estaduais e prefeituras serão “sócios” na divisão desse butim. O seletivo incidirá sobre produtos e serviços consumidos em larga escala, como bebidas, energia elétrica, combustíveis, serviços e aparelhos de comunicação, transporte, cigarro, veículos, pneus e autopeças.
MANICÔMIO O deputado Hauly diz que a atual política fiscal provoca a loucura no sistema tributário (Crédito:Gustavo Lima)
Economistas apoiam a iniciativa do governo, mas divergem em alguns pontos, como a criação de um imposto para compensar os cofres da União. O presidente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o economista Paulo Rabello de Castro, reclamou disso, no passado, em artigo no jornal “O Globo”. “Não há necessidade de se inventar qualquer ‘fundo de compensação’ aos perdedores. Não há perdedores. Ganha, sim, o penado contribuinte, com uma simplificação radical do modo de pagar”, discorreu.
O economista e ex-secretário executivo do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, destaca que a reforma tributária é necessária. Segundo ele, o sistema brasileiro causa distorções. “A ideia de transitar para o modelo do IVA é boa. A questão é como vai ser feita a transição”, apontou.
As alterações propostas na PEC do sistema tributário querem melhorar também o uso da nota fiscal eletrônica, para aumentar a arrecadação e combater a sonegação. A cobrança e repasse de impostos seriam simultâneos. Ou seja, no ato da compra ou do negócio. De acordo com dados de 2015 coletados por Hauly, haverá uma diminuição da sonegação fiscal estimada em R$ 460 bilhões.
,SEM COMPENSAÇÃO Paulo Rabello de Castro, do IBGE, é contra criação de imposto que compense as perdas da União (Crédito:Danilo Verpa/Folhapress)
O Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) teria uma alíquota só para todo o país. Os governos estaduais não poderiam ter a liberdade de definir quanto vão cobrar e arrecadar. O Planalto espera acabar com a guerra fiscal, artifício em que os governos locais tentam reduzir o imposto para atrair indústrias e investidores de outras regiões. Como nem só de unificação de imposto, simplificação de cobrança de tributo e impostos acachapantes vive o contribuinte, tem um tópico que trata de isenção de impostos para alguns produtos. Dois dos apaniguados seriam medicamentos e a comida. Hoje, os produtos dos dois gêneros chegam a pagar 33% de impostos. Na proposta, haveria taxação zero. Além disso, o grupo quer acabar com IOF e os tributos sobre os empréstimos bancários. “O atual sistema, recheado de incentivos fiscais, sonegação, elisão e corrupção transformou o Brasil num manicômio tributário”, detalha Hauly.
Reforma Tributária As mudanças na legislação discutidas entre Governo e a Câmara propõem aumentar a arrecadação combatendo a sonegação e a guerra fiscal entre estados
IVA Texto da PEC que está sendo elaborada cria Imposto sobre Valor Agregado (IVA). Serão agregados sete tributos (ISS, ICMS, IPI, PIS, Cofins, CID, IOF). Esses impostos serão divididos entre estados e municípios. Pela regra atual, PIS e Cofins são recolhidos somente para a União
Imposto Seletivo Monofásico Para compensar a perda que a União terá com o PIS e Cofins, será criado um imposto que incidirá sobre produtos e serviços consumidos em larga escala, como bebidas e energia elétrica
ICMS ICMS nacional. Seria estabelecida uma alíquota que serviria para estados, municípios e União. Não será mais permitido decretos com criação de alíquotas de ICMS dos Estados, para acabar com a guerra fiscal entre os estados
Fim do CSLL Para simplificar a tributação, a proposta prevê apenas um imposto sobre a renda. Acaba com a contribuição sobre lucro líquido (CSLL)