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ALFINETADA: Temer perde apoio da base aliada com avanço da Lava Jato e impopularidade

Especialistas discutem a impopularidade e a capacidade do presidente para tocar as reformas


Michel Temer corre contra o tempo. A cada dia que passa, diminuem as chances de o presidente aprovar no Congresso as reformas da Previdência e Trabalhista. Vários motivos justificam esse cenário. Um deles é a baixa popularidade do presidente, explicada em parte pela não recuperação da economia, pelo elevado desemprego e pela reprovação popular às reformas. Além disso, o avanço da Lava Jato tem sido decisivo para o enfraquecimento do presidente, que vem perdendo o comando da base de apoio.


As delações de 77 executivos da empreiteira Odebrecht — homologadas em janeiro pela presidente do STF (Supremo Tribunal Federal) Cármen Lúcia — estão atingindo em cheio desde o presidente até seu núcleo mais íntimo de amigos, como os ministros Moreira Franco e Eliseu Padilha. Outros nomes fortes do partido, como Henrique Alves, Geddel Vieira Lima, José Yunes e Romero Jucá, já tiveram de deixar o governo após denúncias surgidas dentro e fora da Lava Jato.


“A Lava Jato neste ano vem pegando mais justamente os partidos da base, como o PMDB, o PP e o próprio PSDB”, afirma a cientista política Maria do Socorro Braga, professora da UFSCAR (Universidade Federal de São Carlos).


— Isso acaba deixando a maior parte da base de Temer, que era do PT também, muito mais afetada agora.


A quebra do apoio vem dando sinais mais fortes nas últimas semanas. O nanico PTN, com 13 deputados federais, anunciou na semana passada o rompimento com o governo federal. O senador Renan Calheiros (PMDB-AL) também vem disparando uma série de críticas desde março. Além disso, parlamentares já cogitam deixar as votações das reformas, urgência do presidente, para o segundo semestre.


Para recuperar terreno, Temer se reuniu com aliados no último domingo (9), na residência oficial do presidente da Câmara Rodrigo Maia (DEM-RJ). Também participaram do encontro os ministros Raul Jungmann (Defesa), Bruno Araújo (Cidades), Antonio Imbassahy (Secretaria de Governo), Mendonça Filho (Educação), além do presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), e do líder do governo na Câmara, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB).


“Nos últimos meses, e desde quando a Dilma [Rousseff] era presidente, temos uma série de nomes ligados ao Temer que estão envolvidos na Lava Jato, Isso vai fragilizando cada vez mais a capacidade que Temer teria em tentar agregar forças políticas”, avalia o sociólogo Paulo Silvino Ribeiro, professor da FESPSP (Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo).


— O fato é. Se cada vez mais o governo for envolvido na Lava Jato, e pelo que estamos acompanhando está cada vez mais envolvido, esse centrão cada vez mais vai estar menos interessado em estar associado ao governo Temer.


Denúncias contra Temer e o núcleo duro do PMDB

A denúncia mais grave contra o presidente até o momento partiu da delação do ex-diretor de Relações Institucionais da Odebrecht, Cláudio Melo Filho.

Em depoimento à Lava Jato vazado em dezembro passado, Melo Filho narrou reunião de 2014 na qual Temer teria pedido R$ 10 milhões a Marcelo Odebrecht para a campanha eleitoral daquele ano. Desse total, R$ 6 milhões seriam para a campanha de Paulo Skaf ao governo de São Paulo e R$ 4 milhões para o ministro Eliseu Padilha distribuir no partido.


Segundo Melo Filho, o lobista Lúcio Funaro — que era operador do ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) no esquema de arrecadação de propinas de grandes empresas — foi quem entregou a José Yunes, amigo pessoal de Temer e ex-assessor especial do governo, R$ 1 milhão em dinheiro vivo. O caso obrigou Yunes a deixar o governo.


A denúncia foi repetida pelo ex-executivo da Odebrecht durante depoimento ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) no início de março, no processo que pode cassar a chapa Dilma-Temer.


O episódio envolveu também o atual ministro da Casa Civil Eliseu Padilha. Em 23 de fevereiro passado, o advogado José Yunes confirmou em depoimento à Lava Jato ter recebido um pacote do doleiro Funaro, a pedido de Padilha, um mês antes da eleição presidencial de 2014. Yunes alegou não ter visto o conteúdo do pacote e negou que tenha atuado como operador dos recursos de campanha do PMDB.


Temer reagiu no fim de fevereiro e declarou ter solicitado auxílio “formal e oficial” à empreiteira. “Quando presidente do PMDB, Michel Temer pediu auxílio formal e oficial à Construtora Norberto Odebrecht. Não autorizou, nem solicitou que nada fosse feito sem amparo nas regras da Lei Eleitoral”, informou nota da assessoria da presidência.


Outra denúncia contra Temer partiu da delação do ex-senador Sérgio Machado (PMDB-CE), que foi presidente da Transpetro (subsidiária da Petrobras) entre 2003 e 2014. Machado declarou, em junho de 2016, que Temer lhe pediu R$ 1,5 milhão para a campanha de Gabriel Chalita à Prefeitura de São Paulo em 2012. Temer chegou a declarar na época que, se a informação fosse verdadeira, ele não teria condições de presidir o país.


Em sua delação, Machado ainda declarou ter distribuído mais de R$ 70 milhões em propina de contratos da estatal para o senador Renan Calheiros (PMDB-AL), o senador e ex-ministro Romero Jucá (PMDB-RR), o ex-senador José Sarney (PMDB-AP), além de outros caciques do PMDB.


O viés econômico



Apesar das denúncias, é a situação econômica do país que vem pesando mais contra o governo federal. Dos indicadores econômicos sob Temer, os únicos positivos são o da inflação, sob controle e com projeção de queda, e o da taxa de juros, que pôde ser reduzida graças à inflação baixa.


Em março, Temer pôde anunciar uma das raras boas notícias econômicas da sua gestão, a criação de empregos em fevereiro, após quase dois anos de fechamento de vagas. O otimismo, no entanto, durou pouco. Duas semanas depois, o IBGE divulgou que o País atingiu o recorde de 13,5 milhões de desempregados.


“O governo Temer mostra dificuldade de dar conta de uma agenda que ele se colocou assim que assumiu esse governo", diz a professora Maria do Socorro Braga.


— E é mais uma vez o PMDB, porque no período da Nova República (governo Sarney), eram outras lideranças mas era o velho PMDB, que também foi extremamente impopular com o Plano Cruzado. Hoje algo se repete, essa incapacidade do governo de administrar economicamente o País de uma forma que dê conta [dos problemas econômicos].


Além da retomada lenta na economia, o governo Temer tem que lidar com a dificuldade e o desgaste de negociar reformas altamente impopulares, como a da Previdência e a Trabalhista, que agradam empresários e o setor financeiro mas desagradam grande parte do eleitorado, além de grupos organizados da sociedade civil, como associações de classe e as centrais sindicais de trabalhadores.


No Congresso, integrantes da base aliada disseram, nos bastidores, que a reforma não será aprovada como está porque a retomada da economia ainda é insuficiente e os parlamentares não querem arcar com o ônus de aprovar uma reforma tão dura, o que pode custar votos em 2018.


“As reformas sensibilizam a sociedade porque há impacto para todos”, diz o cientista político e doutor pela UnB (Universidade de Brasília) Leonardo Barreto.


— Ou o governo muda o texto ou não a aprova. Além das mudanças aceitas na semana passada, com transição mais branda, proteção aos trabalhadores rurais, tem que mudar a idade mínima, para 60 anos para os homens e 58 anos para as mulheres.


Segundo Silvino, as melhoras “pontuais” da economia, como a queda da inflação, não modificaram a situação de vida do brasileiro.


— Com o Temer as coisas não melhoraram. Indiretamente a população vai percebendo que ainda tem muita gente envolvida com a corrupção. Mas como infelizmente a corrupção se naturalizou, isso não afronta tanto quanto o cara saber se terá ou não dinheiro para fazer a compra do mês. E isso tudo conjuntamente faz com que sua popularidade seja cada vez menor. Mas todas essas reformas que ele se propõe não são fáceis. Precisa ter apoio político, de outro atores sociais, como os trabalhadores, os industriais, ter um apoio da sociedade.


A qualidade da política

Para Silvino, a pressão que a base aliada coloca agora sobre o governo Temer não é nenhuma novidade na política brasileira. "Esses impasses são característica do tipo de base aliada que o governo tem", diz.


— É o chamado centrão, que é um grupo de políticos que, embora tenham seus partidos, não têm fidelidade ideológica e nem mesmo politica com o Executivo. Esses impasses vêm dessa infidelidade, vêm dessa forma de fazer política, sem ter uma plataforma realmente definida. Continuam agindo conforme seus interesses pessoais e políticos.


A cientista Maria do Socorro aponta como "grave" o fato de um partido como o PMDB, dos mais antigos do país, não possuir um claro projeto político para o país.


— O PMDB não demonstrou ainda essa capacidade de pensar um projeto político para o país. E é sério isso, porque ele é um dos partidos mais antigos do nosso sistema político, mas ele é parasitário, porque não consegue pensar em um projeto político que consiga atrair os diferentes segmentos importantes da opinião pública do Brasil.


Silvino relembra a foto inaugural do governo Temer, de 12 de maio passado, quando o presidente e seus aliados deram uma entrevista coletiva no Palácio do Planalto minutos após Dilma deixar o local.


— Eles não estão mais tão consolidados. Aquela foto representou a união de todas as forças de direita e do centro e que tinham ali um coro, quase um dogma, de que era preciso tirar a presidenta Dilma, de que o PT representava a corrupção, e que Temer traria a tal da ordem e progresso, esse lema positivista do século 19. Mas essa união, essa certeza, essa consolidação, essa postura política está esgarçada. (...) Então os que apoiam Temer hoje, a depender dos rumos que as coisas tomarem, podem retirar o apoio tranquilamente e dizer que estão fazendo isso em nome do brasil, justamente o que fizeram com a Dilma.

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